Defensores do fecho de Guantánamo desiludidos com Biden nos 20 anos da prisão
10 de jan. de 2022, 18:10
— Lusa/AO Online
"O Presidente Biden declarou a
intenção de encerrar Guantánamo como uma questão política, mas não
tomou medidas substanciais para o encerramento", disse o advogado Wells
Dixon do Centro para os Direitos Constitucionais, com sede em Nova
Iorque, à agência de notícias Associated Press (AP).Também
em declarações à AP, a diretora do programa de segurança com direitos
humanos da Amnistia Internacional dos Estados Unidos da América (EUA),
Daphne Eviatar, disse que "há muita impaciência e muita frustração” com
Biden entre os defensores do encerramento.Situado
numa base dos EUA na costa sudeste da ilha de Cuba, o centro recebeu os
primeiros prisioneiros em 11 de janeiro de 2002, no âmbito da guerra ao
terrorismo declarada pelo então Presidente, o republicano George W.
Bush (2001-2009), após os atentados de 11 de setembro de 2001, em que
morreram cerca de 3.000 pessoas.Permanecem
em Guantánamo 39 prisioneiros, 27 sem acusações criminais, o número
mais reduzido desde a abertura da prisão para pessoas suspeitas de terem
uma ligação à Al-Qaida ou aos talibãs, que ali começaram a chegar
encapuçados, algemados e vestidos com fato-macaco laranja em voos
provenientes do Afeganistão.Os defensores
do encerramento temem agora uma repetição do que aconteceu durante a
administração de Barack Obama (2009-2017), que prometeu fechar
Guantánamo quando tomou posse, mas conseguiu apenas reduzir o número de
detidos face à oposição política no Congresso norte-americano.As
restrições impostas pelo Congresso incluem a proibição de regresso dos
prisioneiros a certos países, incluindo o Iémen e a Somália, ou o envio
de qualquer prisioneiro para os EUA, mesmo para novas prisões."Quero
dar-lhes o devido processo consistente com o estar em guerra, e, se
necessário, quero mantê-los presos o tempo que for preciso para nos
manter em segurança", resumiu o senador republicano Lindsey Graham,
citado pela AP.O sucessor de Obama, Donald
Trump (2017-2021), também nada fez para encerrar Guantánamo, apesar de
ter considerado uma loucura o custo anual de funcionamento do centro:
cerca de 13 milhões de dólares (11,5 milhões de euros) por prisioneiro.O
otimismo voltou com Biden, que foi vice-Presidente de Obama, mas, à
medida que a nova administração democrata caminha para o seu primeiro
aniversário (20 de janeiro) sem qualquer sinal de progresso, a não ser
uma libertação no verão passado, o ceticismo e a impaciência voltaram."Não
podemos esquecer o que este país fez há 20 anos e continua a fazer
hoje. Esta administração tem muito em que pensar, certamente, mas esta é
uma ofensa demasiado flagrante aos direitos humanos ", disse Daphne
Eviatar à AP, cuja organização, a Amnistia Internacional EUA, vai
organizar um comício virtual na terça-feira para exigir o encerramento.Guantánamo
tornou-se o foco da indignação internacional devido à prática
documentada de maus-tratos e torturas, e à insistência dos EUA de que
poderia manter os suspeitos presos sem acusação por se tratar de uma
guerra contra o terrorismo, não sujeita à Convenção de Genebra sobre o
tratamento de prisioneiros de guerra.A ala
dos críticos passou a incluir Michael Lehnert, um general do Corpo de
Fuzileiros Navais, agora reformado, que recebeu a missão de abrir o
centro de detenção em 2002, mas que passou a defender o seu
encerramento."Para mim, a existência de
Guantánamo é um anátema a tudo o que representamos, e precisa de ser
encerrado por essa razão", disse Lehnert, citado pela AP. No
seu auge, em 2003, estiveram detidas simultaneamente em Guantánamo
quase 680 pessoas. George W. Bush libertou mais de 500 e Obama 197.Das
que restam, 10 enfrentam julgamento por uma comissão militar em
processos que se arrastam há anos, incluindo Khalid Shaikh Mohammad, o
autoproclamado orquestrador do 11 de setembro.Num
relatório divulgado no domingo, citado pela agência de notícias
espanhola EFE, a Human Rights Watch (HRW) denunciou os custos humanos,
morais e económicos do centro de detenção."Guantánamo
continua a ser um dos símbolos mais duradouros da injustiça, do abuso e
do desrespeito pelo Estado de direito que os EUA empregaram em resposta
aos ataques do 11 de setembro", disse a diretora-adjunta da HRW para a
Crise e Conflito e coautora do relatório, Letta Tayler.No
documento, a organização com sede em Nova Iorque denuncia que os EUA
não responsabilizaram ninguém pelo seu programa de detenção secreta e
tortura em prisões militares em países como o Afeganistão e o Iraque,
bem como em Guantánamo.A HRW considera que
a utilização destas práticas pelos EUA prejudicou todo o sistema
internacional de direitos humanos, facilitando abusos e a justificação
desses por parte de outros países.Segundo a HRW, os EUA gastam 540 milhões de dólares (477 milhões de euros) por ano apenas para manter detidos em Guantánamo.Os
custos da chamada "Guerra ao Terror" ascendem já a mais de 5,48
triliões de dólares (4,84 biliões de euros), ainda de acordo com a
organização."Este relatório apresenta uma
análise abrangente dos muitos custos inaceitáveis da detenção e entrega
ilegal de muçulmanos nos EUA nos últimos 20 anos desde o 11 de
setembro", disse a codirectora do Projeto Custos da Guerra da
Universidade de Brown, Stephanie Savell, que colaborou com a HRW no
documento."É um fracasso moral de
proporções épicas, uma mancha no registo dos direitos humanos do país,
um erro estratégico, e uma perpetuação horrenda da islamofobia e do
racismo”, acrescentou.