Danças e bailinhos de Carnaval da ilha Terceira devem ser mais divulgados
9 de fev. de 2024, 16:21
— Lusa/AO Online
“Sei de pessoas que vêm
dos Estados Unidos [da América], do Canadá, e conheço alguns casais do
continente que vêm de propósito para o nosso Carnaval”, afirma, em
declarações à Lusa.Entre sábado e
a terça-feira de Carnaval, mais de meia centena de grupos de atores e
músicos amadores percorrem cerca de três dezenas de salas de espetáculos
de toda a ilha, atuando de forma gratuita, pela madrugada dentro.“Na
nossa ilha, em casa sim casa não mora um artista: ou é músico ou
escreve, ou representa, ou é dançarino”, salienta Hélio Costa.Divididas
em danças de pandeiro, danças de espada, bailinhos e comédias, as
manifestações intercalam música e teatro, escritos em rima, com crítica
social.Milhares de pessoas sobem aos
palcos e muitas mais aguardam pacientemente pelos grupos nos salões, que
chegam a fechar já depois do sol nascer.“O
Carnaval é feito com o povo todo da ilha. São 50.000 pessoas que
participam nisto. É único no mundo, é diferente de todos, é rico em
cultura”, frisa o escritor.Aos 69 anos, Hélio Costa já escreveu mais de 1.300 assuntos (texto do teatro) para danças e bailinhos de Carnaval.Confessa
que se sente “triste” quando, por esta altura, vê na televisão
referências às manifestações de Carnaval do país e o da Terceira fica
esquecido.“É pena não ser mais divulgado. Se calhar as entidades oficiais podiam fazer mais alguma coisa pelo nosso Carnaval”, aponta.Tinha
oito anos quando participou pela primeira vez numa dança de Carnaval,
numa época em que ainda atuavam na rua e nas casas dos vizinhos.Em
1985, o grupo em que participava desafiou-o a escrever o assunto. O
resultado agradou e Hélio Costa transformou-se num dos mais requisitados
autores do Carnaval da Terceira.Em média,
escrevia mais de 40 assuntos por ano e, em 2008, chegou mesmo a
entregar 58, não só para a ilha, mas para as comunidades emigrantes nos
Estados Unidos e Canadá, que dão continuidade à tradição.A
pandemia de covid-19 deixou os salões da Terceira vazios durante dois
anos e quando as danças e bailinhos regressaram, em 2023, Hélio Costa
decidiu deixar de escrever.“Senti uma
falta enorme e um vazio na minha vida, porque eu passava o ano quase
todo de roda de enredos [textos]. A partir de setembro tinha gente em
casa quase todos os dias”, conta.Estava
decidido a pousar a caneta de vez, mas, este ano, um grupo pediu-lhe
ajuda e quando aceitou escrever o primeiro assunto a palavra foi-se
espalhando.“Escrevi oito, só uma coisa para matar a saudade”, adianta.Há
mais de duas décadas que Hélio Costa trocou os palcos pelos bastidores
no Carnaval, mas quando assiste a um bailinho com texto seu fica “com os
mesmos nervinhos” dos atores.“Estou a
torcer para que corra tudo bem e quando corre bem é claro que também
gosto. Quando corre menos bem, tenho de aceitar”, revela.Num
Carnaval sem regras, manda a tradição que o texto das cantigas e do
teatro seja em rima, o que para Hélio Costa nunca foi um problema.“A
rima sai facilmente. O mais difícil é sobre o que escrever, porque já
se escreveu sobre tudo e os grupos querem sempre alguma coisa de novo”,
explica.Hoje está aposentado, mas quando era taxista, muitos dos temas surgiam nas viagens de carro pela ilha.“Cheguei
a parar para escrever. Se não tinha pessoas comigo e se surgia uma
ideia boa, eu encostava o carro e tomava pelo menos uma nota para que
não me esquecesse”, lembra.Figura
incontornável do Carnaval da Terceira, Hélio Costa dá nome ao museu
criado em 2005 na vila das Lajes, para dar a conhecer esta tradição, que
acredita ter futuro garantido.Esta
semana, assistiu ao ensaio de uma dança e enquanto os adultos se
concentravam nos seus papéis, reparou numa criança de três anos, que
batia com o pandeiro a imitar os primos.“O
nosso Carnaval está para continuar, porque está no sangue do povo e
vê-se muita juventude a aderir ao Carnaval todos os anos”, sublinha.