Cursos para atrair jovens numa das escolas com mais abandono nunca abriram
22 de jun. de 2024, 08:07
— Silvia Maia/Lusa
A
Escola Básica Integrada de Rabo de Peixe, na ilha de São Miguel, é
apontada como um dos “pontos negros” do insucesso e abandono escolar: “A
taxa de abandono nos Açores é o dobro do continente e na escola de Rabo
de Peixe é o dobro da média açoriana”, lamentou o presidente da Câmara
Municipal de Ribeira Grande, Alexandre Gaudêncio, em entrevista à Lusa.Quase
metade dos alunos que estavam em risco de chumbar no final deste
primeiro semestre era por abandono escolar, revelou o presidente do
conselho executivo da Escola Básica Integrada de Rabo de Peixe, André
Melo. O levantamento feito este ano mostrou que 47% destes estudantes do
2.º e do 3.º ciclos tinham muitas faltas de assiduidade.Muitas
crianças chegam ao 5.º ano e desinteressam-se pela escola. Não
conseguem acompanhar as matérias e, gradualmente, começam a faltar.“Percebemos
logo quando não querem estar na sala de aula. Têm dificuldades, não
conseguem estar com atenção e nós continuamos a persistir no ensino
regular”, lamentou o diretor.Para combater
o insucesso, o Governo gastou cerca de 20 milhões de euros na
requalificação da escola: o moderno edifício tem hoje um polidesportivo,
piscinas, uma pista de atletismo com vista para o mar e oficinas de
Carpintaria, Cerâmica, Mecanotecnia, Eletrotecnia e Culinária. As oficinas estão prontas a usar, mas faltam equipamentos e materiais para trabalhar, denunciou o diretor.A
gigantesca sala de culinária, por exemplo, parece um cenário de um
programa de televisão ou de uma telenovela. Tem uma enorme ilha com um
fogão e exaustor, um lava-loiças e gigantescos armários com
eletrodomésticos embutidos, mas não há nada dentro dos armários: Nem
loiça, nem alimentos ou condimentos para cozinhar.“Temos
cinco oficinas, mas ainda não estão a funcionar por falta de
financiamento. Não conseguimos comprar o material necessário para fazer
aulas diferentes para os alunos, sendo que é isto que eles precisam”,
desabafou André Melo.Com estes projetos,
os alunos poderiam interessar-se novamente pela escola, em vez de
“estarem sentados o dia inteiro, com um caderno à frente e um professor a
dar aulas”, disse.No entanto, a única
oficina que está a ser usada é a de carpintaria. Os materiais que os
alunos usam são lixo apanhado na praia pelos professores, contou à Lusa
Vladimir Ferreira, docente de Educação Tecnológica. Tampas
de garrafas, pedaços de plástico colorido, paus e pedaços de redes de
pesca servem para fazer uma escultura que deverá ser afixada numa das
paredes da escola, à semelhança de outras já em exposição.Quando
a Lusa visitou a escola, estavam apenas dois alunos na aula de Vladimir
Ferreira. O professor disse que normalmente tem mais de uma dezena na
sala, mas na altura das festas do concelho as faltas aumentam.Na
escola com cerca de dois mil alunos, conseguir que os alunos terminem o
9.º ano “é já uma grande vitória”, admitiu o diretor, explicando que
depois de vários chumbos, há muitos alunos de 17 anos ainda a frequentar
o 3.º ciclo. Quando atingem a maioridade, abandonam a escola. Os
Açores são a segunda região da Europa com a mais elevada taxa de
abandono escolar precoce (21,7%), apenas ultrapassada por uma zona da
Roménia, disse o sociólogo Fernando Diogo. A
situação do arquipélago tem vindo a melhorar desde o início do século,
mas é preciso “continuar a trilhar esse percurso”, reconheceu a
Secretária Regional de Educação, Sofia Ribeiro, em entrevista à Lusa.“Nas
últimas décadas têm sido inúmeros os trabalhos de acompanhamento de
jovens”, disse Sofia Ribeiro, salientando que começaram agora a fazer
“um acompanhamento de todos os alunos que no final do ano escolar não se
matriculam”, mesmo quando já têm mais de 18 anos.Pela
primeira vez este ano, analisaram “as matrículas de todos os alunos,
fazendo um filtro dos que não tendo completado o ensino secundário,
tinham desaparecido do sistema”, revelou, explicando que a estes foram
oferecidos “outros percursos de formação para assim combater o abandono
precoce”.