Covid-19: Flores sem casos mas com população apreensiva e empresários em dificuldades

25 de abr. de 2020, 10:13 — AO Online/ Lusa

"As pessoas estão um bocado apreensivas, obviamente. Desde o início do surto que também tomámos medidas preventivas e não se vê praticamente ninguém nas ruas", disse à Lusa o presidente da Câmara Municipal das Lajes - um dos dois municípios da ilha -, Luís Maciel.Para o autarca, a redução das ligações aéreas interilhas "a casos de força maior" - conforme anunciou o presidente do Governo Regional, Vasco Cordeiro, aquando da decisão em 19 de março - foi a medida "mais importante" e "decisiva" para evitar que o novo coronavírus chegasse às Flores.Mesmo com as ligações áreas reduzidas, o autarca sinalizou que é "preciso continuar a acompanhar atentamente" a evolução do surto."Continuámos a ter ligações com o exterior. Apesar de estarem muito reduzidas só mesmo aos casos essenciais, continua a haver. Ainda tivemos algumas pessoas que tiveram no hospital em Ponta Delgada e que têm sido testadas. Não podemos estar completamente descansados", ressalvou.Luís Maciel considera que esta foi uma das situações em que o isolamento "jogou a favor" da ilha mais ocidental do arquipélago, mas frisa ser "importante manter cuidados" quando se começar a retomar a normalidade."Vamos ouvindo que é previsível a nível nacional começar a retomar gradualmente certas atividades. É possível que isso aqui aconteça aqui, mas não estamos completamente isolados e não é impossível aparecer algum caso. É importante continuar a ter cuidados", apontou.A maior preocupação para o bombeiro Fabiano Costa, do corpo de bombeiros de Santa Cruz das Flores, é que a população "baixe a guarda" nas medidas de proteção."É a minha preocupação, minha e a que qualquer cidadão deve ter. Por não ter havido nenhum caso confirmado nas Flores não quer vir a dizer que não possa acontecer. E é esta fase de abrandamento ou relaxe que pode provocar alguma situação, é disso que tenho receio", destacou.Um receio que, para já, não se confirma, uma vez que a "maior parte" da população está em casa e a cumprir os "protocolos de higienização", segundo Fabiano Costa, que afirma que o corpo dos bombeiros está preparado para agir caso seja necessário."Nós estamos devidamente preparados e com bastante material de proteção individual para qualquer atenção. O nosso pessoal está tecnicamente habilitado a agir em conformidade", referiu.Já Arlindo Lourenço, proprietário da maior cadeia de supermercados da ilha, afirmou que, apesar de não ter "quebras significativas" na faturação, está "revoltado" por não conseguir colmatar a ausência dos funcionários que se encontram em casa com os filhos."Estou em contraciclo com as empresas quase todas do país. Estou a tentar recrutar pessoal, a mandar ofertas para o centro de emprego e não consigo admitir pessoas. Tenho a responsabilidade de manter o estabelecimento aberto e não consigo dar resposta", explicou.Para o empresário, a situação atual é "de longe pior" das que viveu quer em outubro de 2019, aquando da destruição do porto das Lajes pela passagem do furacão Lorenzo, quer entre dezembro de 2019 e janeiro de 2020.Durante esse período, a ilha ficou perto de um mês sem abastecimento marítimo devido às más condições climatéricas que impediram a operação das embarcações de tráfego local, responsáveis por assegurar o abastecimento após a destruição do cais comercial do porto."Quando o porto ficou destruído e ficámos sem produtos perdemos faturação, mas o trabalho diminuiu. Agora temos uma pressão de trabalho extra em cima de nós e não temos colaboradores para exercer as atividades", descreveu o empresário.Arlindo Lourenço diz ser "descabido" paralisar a economia da ilha por um problema que não existe nas Flores, defendendo que as restrições deviam ser aplicadas "conforme o contexto de cada zona"."Se querem começar a diminuir restrições nos locais infetados, por que é que ainda não aliviaram nos locais sem quaisquer infetados?", questionou.Também a atravessar problemas, mas de diferente ordem, está Arménio Carneiro, detentor de um supermercado, um armazém de revenda e uma bomba de gasolina: "Nós apanhámos duas de seguida", disse, referindo-se à passagem do furacão (que causou mais de 330 milhões de prejuízos em toda a região) e às consequências económicas da pandemia.Apesar de as vendas do supermercado irem "andando", nos outros estabelecimentos a diferença na faturação face ao mesmo período do ano passado é de menos 50 mil euros."Estou a ter prejuízo, mas primeiro do que tudo está a saúde, a minha e a dos meus concidadãos. Quem de direito é que deve tomar as iniciativas de abrir ou não a economia. Não somos nós que somos leigos nesses assuntos", assinalou.Com menos de quatro mil habitantes, ilha das Flores é composta pelos concelhos das Lajes e de Santa Cruz, e constitui, juntamente com o Corvo, o grupo Ocidental, o mais distante em relação ao continente.Entre as Flores e a ilha mais próxima do grupo Central, o Faial, distam mais de 220 quilómetros em linha reta.Flores, Corvo e Santa Maria são as únicas ilhas dos Açores que não registam qualquer caso positivo de covid-19.