Conferência revela mobilização luso-americana que chegou à Casa Branca no 25 de abril
28 de set. de 2023, 05:54
— Lusa/AO Online
A professora
luso-americana Daniela F. Melo, da Universidade de Boston, considerou
“extraordinária” a força da mobilização da comunidade em 1975 e 1976,
algo que acabou por cair no esquecimento académico e ficou de fora
da obra publicada depois da revolução. A
sua pesquisa foi apresentada hoje na sessão de abertura da 47ª
conferência anual da Luso-American Education Foundation (LAEF), que
decorre até 30 de setembro. “É importante
perceber que a capacidade de um grupo da diáspora conseguir entrar na
Casa Branca é extraordinária”, afirmou a cientista política. “Não é algo
que aconteça sem uma série de peças – capacidade e oportunidade – a
juntar-se para mobilizar e puxar as alavancas certas para abrir as
portas da Casa Branca”. A delegação, que
incluiu personalidades importantes da diáspora na altura, Joseph E.
Fernandes e Julio V. d’Oliveira, tentava influenciar a administração
norte-americana no sentido de ajudar as forças anticomunistas em
Portugal e direcionar ajuda monetária diretamente aos Açores.“Havia
um número de indivíduos em Nova Inglaterra que estavam muito bem
integrados nas suas comunidades e na política local e estadual e que
conseguiram ativar essas redes para abrir as portas da Casa Branca às
suas preocupações”, explicou a politóloga. A
chegada à Sala Oval a 9 de setembro de 1975 ilustra o dinamismo das
movimentações políticas da diáspora portuguesa nos Estados Unidos, cujo
movimento gerou manifestações com milhares de pessoas em Washington,
D.C. e em Nova Iorque, à frente da sede das Nações Unidas. “Os
luso-americanos nos anos setenta tinham uma extensa rede de jornais,
estações de rádio e televisão, tanto em português como inglês”, referiu a
professora. Também havia centenas de clubes e sociedades portuguesas
bem estabelecidas, que se tornaram espaços "onde os luso-americanos se
mobilizaram politicamente durante a revolução”. Não
só houve uma cobertura muito detalhada da situação em Portugal nos
jornais da comunidade, com destaque para o Portuguese Times, como
inclusive padres que ajudaram na mobilização. “Havia
uma preocupação de que a revolução não seria tão democrática quanto os
luso-americanos tinham antecipado”, indicou a especialista. O entusiasmo
do 25 de abril deu lugar ao receio, com uma manchete no Portuguese
Times em agosto de 1974 a dizer “Os cravos da revolução estão a
murchar”. A equipa editorial deste jornal
tentou ativamente influenciar políticos em Nova Inglaterra e Nova Jersey
e incentivou os leitores a pedir pressão ao governo provisório em
Portugal para remover comunistas. Congressistas
em áreas com muitos luso-americanos recebiam cartas constantemente a
alertar para a situação e houve sucessivas iniciativas de angariação de
fundos bem-sucedidas, tanto para auxiliar os líderes anticomunistas em
Portugal como para financiar o movimento independentista dos Açores. Daniela
Melo identificou quatro organizações pró independência ativas só na
Nova Inglaterra: Movimento para a Autodeterminação do Povo Açoriano,
Movimento para a Independência dos Açores, Frente para a Libertação dos
Açores (FLA) e Comité Açoriano 75 (CA-75). Estes esforços não passaram despercebidos em Portugal durante o período tenso que se seguiu à revolução. “É
muito claro que os partidos políticos em Portugal estavam a contar com a
mobilização para obter apoio financeiro para as suas atividades”,
referiu Daniela Melo. A professora
sublinhou que “há aqui toda uma história que tem de ser descompactada” e
disse que vai continuar a sua pesquisa, alargando-a a mais regiões e
comunidades portuguesas nos Estados Unidos. A
apresentação “A diáspora e a revolução”, explorando o ativismo
luso-americano em 1974-75, foi feita na abertura da 47ª conferência da
LAEF, que este ano é dedicada aos (quase) 50 anos de democracia em
Portugal. Intitulada “Cravos em
Setembro?”, a conferência tem a organização do Instituto Português
Além-Fronteiras (PBBI) na Califórnia e contou com declarações de José
Andrade, diretor regional das comunidades no governo dos Açores, na
sessão de abertura. O responsável
sublinhou a oportunidade do tema e disse que, no último meio século, “os
Açores tiveram um desenvolvimento maior que o que tiveram nos cinco
séculos anteriores”.