Clube português nos EUA prepara centenário e lamenta falta de "sangue novo"
27 de out. de 2024, 08:30
— Lusa
Num
fim de semana normal, passam cerca de 400 pessoas pelo 'Portuguese
Sport Club of Waterbury', que serve à comunidade do estado de
Connecticut os pratos mais típicos da culinária portuguesa sete dias por
semana, indicou à Lusa a direção.Os cerca
de mil sócios do clube fundado em 1929 já pensam nas celebrações do
centenário, mas o futuro é incerto devido à redução da emigração
portuguesa para os Estados Unidos (EUA) e à "falta de interesse da
juventude" na programação oferecida, um problema transversal a várias
associações e clubes portugueses por todo o país.Face a esses entraves - e para tentar garantir a sua continuidade -, o clube abriu portas a outras nacionalidades."Como
não temos novas pessoas a vir, então tivemos que abrir o clube a outras
nacionalidades", explicou à Lusa o presidente do clube, Reinaldo Sousa.Os mais jovens "já não estão tão envolvidos como nós, mas fazemos tudo o que podemos para continuar", acrescentou.Reinaldo
Sousa apontou que o clube português de Waterbury "gera para cima de um
milhão de dólares" (cerca de um milhão de euros) por ano, um sucesso só
possível graças ao trabalho voluntário dos membros da direção e a muito
sacrifício pessoal."Esta já não é uma casa
pequenina, isto é já um negócio e continuamos a ser voluntários (...)
Já dá muito trabalho. (...) Nós saímos da nossa terra com um grande
orgulho e continuamos", afirmou Sousa, emocionado.Quem
já presidiu o clube por cinco mandatos e esteve envolvido na sua
reestruturação foi Manuel Freitas, a viver nos EUA há 36 anos, que
refletiu sobre todo o esforço dedicado a este espaço ao longo das
últimas décadas."Fizemos muitas obras, com
muito sacrifício e trabalho (...) nós tivemos que trabalhar e pôr o
nosso tempo aqui. Não podíamos pagar a empregados como estamos a pagar
hoje", contou, admitindo que chegou a trabalhar voluntariamente no clube
durante várias madrugadas e a seguir diretamente para o seu trabalho
sem dormir.Contudo, "os nossos filhos não
vêm, não querem vir", disse o luso-americano, observando que os clubes
"talvez não tenham certas regalias para atrair" os jovens. "Gostava
de ver este clube continuar por muitos mais anos, mas, nas condições de
hoje, não sabemos o que vai acontecer amanhã", advogou Manuel Freitas,
cujas origens remontam a Vila Real.Segundo
o censo de 2020, Waterbury - a segunda maior cidade do Condado de New
Haven, e que dista 124 quilómetros de Nova Iorque - tem uma população de
cerca de 114 mil habitantes. O
'Portuguese Sport Club of Waterbury' não mantém a localização original. A
passagem de uma estrada obrigou à mudança e a comunidade portuguesa
colocou mãos à obra, tendo construído um clube de maiores dimensões, com
parque de estacionamento, salão de festas, restaurante, bar,
escritórios, entre outros.Maria José
Monteiro, de 70 anos e natural de Amarante, foi a primeira mulher a
presidir o clube. Olhando para o passado, assumiu à Lusa ter sido "um
ano terrível, porque os homens não aceitam muito serem comandados por
uma mulher". Quando questionada sobre a maior dificuldade, respondeu:
"fazer os mais velhos mudar de mentalidade"."A
maior parte dos sócios já são pessoas reformadas, incluindo eu, mas que
já não têm um espírito tão aberto como os que chegam agora e os que
nascem aqui", afirmou.Entre as propostas
da septuagenária para atrair a juventude estão a criação de um campo de
futebol e de jogos recreativos, mas também incentivos para "ensinar as
meninas a fazerem coisas domésticas", porque "agora ninguém pensa nisso"
e "o saber não ocupa lugar, nem que seja enfiar uma agulha", defendeu. Maria
José não deixou de assinalar a entreajuda que reina nesta comunidade
portuguesa, destacando que quando alguma família enfrenta problemas de
saúde graves, normalmente é feita uma festa e o dinheiro angariado
reverte para as despesas hospitalares – num país em que a “saúde é muito
cara”.Um dos membros mais antigos do
clube é Diamantino Oliveira, de 81 anos e a viver há 56 nos EUA. É, há
nove anos, presidente da assembleia-geral do clube, o qual considera "o
melhor de todos", e não esconde o desejo de conseguir presenciar as
celebrações do centenário, em 2029.Porém, não está otimista em relação ao futuro."A
emigração praticamente acabou aqui. Antigamente, quase todas as semanas
chegavam emigrantes e juntavam-se ao clube. Hoje já não é assim. (...)
Praticamente é a velhice que continua aqui a trabalhar e digo uma coisa:
tirando o Rancho, a mocidade daqui praticamente acabou", asseverou."Gostaria
que houvesse sangue novo para ver se conseguia trazer a mocidade para
aqui e que tivesse ideias diferentes das que nós temos", concluiu
Diamantino Oliveira.