Autor: Lusa
Biólogo, investigador principal do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), presidente da Associação Portuguesa de Oceanografia (APOCEAN), Miguel Santos falou à agência Lusa sobre o lançamento de flutuadores de uma rede de observação do oceano global, um projeto chamado Argo, e da importância dos oceanos na regulação do clima.
O especialista explicou que as correntes oceânicas se formam nos polos e acontecem devido às diferenças de densidade da água, que depende da temperatura e da salinidade. É a chamada “circulação termoalina”, um movimento em todos os oceanos em que as águas mais frias e salgadas afundam, as mais quentes e doces sobem.
Este movimento é fundamental para a regulação do clima no planeta mas, admite o também investigador do Centro de Ciências do Mar, da Universidade do Algarve, pode estar a sofrer alterações devido ao aquecimento global.
Desde logo porque o gelo é um refletor de calor e se diminuir aumenta a capacidade de o oceano ganhar calor, além de que o degelo dos glaciares leva a que haja mais água doce a entrar nos oceanos, que “não afunda tanto e não há essa circulação em profundidade”.
Referindo estudos que indicam que a corrente termoalina está a diminuir de intensidade, o investigador disse que se tal acontecer pode levar a épocas glaciares.
“Estamos mais ou menos na mesma latitude que Nova Iorque. Porque é que neva em Nova Iorque e não neva em Lisboa?”, pergunta, para responder de seguida: Por causa dessa circulação. A corrente do golfo (corrente de água quente do golfo do México para o Atlântico norte) do lado europeu do Atlântico é muito mais quente e leva a invernos mais suaves do que o lado americano. Se essa corrente diminuir de intensidade vem menos calor para a Europa e pode levar a invernos mais rigoroso e a glaciações.
Miguel Santos disse que é difícil prever se e quando tal pode acontecer. “Há quem diga que essa circulação pode parar, eu não acredito nisso, o que se acredita é que está a diminuir de intensidade”, o que pode provocar diversas alterações no clima, “porque o sistema climático está muito associado ao oceano”.
O que o investigador não tem dúvidas é que a ação do Homem está a mudar o clima e que o desequilíbrio pode ser perigoso para os seres humanos, que eles podem um dia desaparecer, que o planeta se vai modificar.
Mas não é alarmista, nem sequer pessimista. Quando questionado pela Lusa se as temperaturas altas da água do mar, neste verão, são uma consequência do aquecimento global, responde serem apenas a “variabilidade natural”.
Mas já não vê como natural a forma como são tratados os oceanos, a sobrepesca, os plásticos. “O mar sempre foi visto como um sítio para onde se podiam mandar, porque não se vê”.
Miguel Santos diz que a APOCEAN quer divulgar mais a oceanografia, chegar à população, aos jovens. “Há poucos oceanógrafos e temos um mar enorme. E não temos dinheiro para ir para o mar, o mar aberto e é quase desconhecido”, lamenta, concluindo: “Na realidade as pessoas não sabem o que se passa no mar, e temos de dinamizar isso”.
Então, por desconhecimento, os seres humanos estão a destruir o mar? Miguel Santos sorri. “Vai aguentar-se. Nós é que não nos vamos aguentar. E não estamos a perceber isso”.