“Chumbo da especialidade de urgência é oportunidade perdida"
13 de dez. de 2022, 12:04
— Lusa/AO Online
“Infelizmente,
do meu ponto de vista, essa votação foi negativa, inviabilizando-se
assim aquilo que era uma oportunidade única de mudar o paradigma
nacional no que diz respeito aos cuidados de saúde urgentes”, adiantou à
agência Lusa Nelson Pereira.O diretor da
Unidade Autónoma de Gestão de Urgência e Medicina Intensiva do Centro
Hospitalar de São João foi o impulsionador de um manifesto, divulgado na
última semana, em que 56 antigos e atuais diretores de serviços de
urgência do país defendiam a criação da especialidade de Medicina de
Urgência.“Numa altura em que é bem claro
para a classe médica, bem como para os cidadãos, a existência de enormes
insuficiências na entrega de cuidados de urgência na nossa rede
hospitalar, torna-se indispensável dar este passo real na prossecução da
melhoria desses cuidados”, referia o documento.Na
reunião realizada, a Assembleia de Representantes da Ordem dos
Médicos (OM), um órgão que junta os médicos de todos os distritos do
país e das regiões autónomas dos Açores e da Madeira, “chumbou” a
criação da especialidade, encerrando, para já, este processo com cerca
de três anos.Na reação ao resultado,
Nelson Pereira lamentou que a Assembleia da OM tenha decidido “ficar não
do lado da solução, mas do problema”, fazendo com que o país retroceda
“mais algum tempo neste caminho” de 50 anos de atraso relativamente aos
primeiros países que desenvolveram esta especialidade.“Somos,
mais uma vez, a cauda da Europa, onde três países não reconhecem esta
especialidade” (Portugal, Áustria e Chipre), referiu o diretor do
Departamento de Urgência do Hospital de São João.Segundo
adiantou, os médicos que estão nas urgências com a responsabilidade de
organizar as equipas “estão a passar pelas enormes dificuldades que são
públicas e notórias” e “não têm dúvida nenhuma que o caminho” passa pela
criação desta nova especialidade.“Acho
que há aqui um corporativismo nesta decisão. Obviamente só posso
lamentá-lo. O doente não esteve no centro da decisão. O que esteve no
centro da decisão foi o que, eventualmente, esta ou aquela especialidade
poderia perder com a criação de uma nova”, afirmou Nelson Pereira.Segundo
avançou o médico, o projeto para criação da especialidade de Medicina
de Urgência teve a oposição dos colégios de medicina interna, pediatria e
medicina geral e familiar, os três mais representativos em termos do
número de médicos."O facto de a votação
ter tido esse sentido tem, certamente, a ver com uma posição destas
especialidades. Vamos continuar este nosso caminho de luta pelos
interesses dos doentes”, assegurou Nelson Pereira.O
projeto de criação desta nova especialidade previa um plano curricular
com cinco anos, o que permitiria ter os primeiros especialistas em
Medicina de Urgência formados dentro de seis anos.Antes
da votação, a presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina
Interna (SPMI), Lélita Santos, tinha considerado a criação da nova
especialidade como inoportuna, alegando a necessidade
de primeiro organizar ou reorganizar o Serviço Nacional de Saúde (SNS).Numa
reação à Lusa antes da reunião da ordem, o diretor executivo do
SNS salientou que a existência dessa especialidade permitiria a
definição de uma carreira, melhorando a qualificação dos médicos, mas
também criando condições para recrutar e fixar mais desses profissionais
de saúde no SNS.“Este caminho não coloca
em causa a presença das outras especialidades nos serviços de urgência,
bem como o seu relevantíssimo papel”, disse Fernando Araújo na altura.