Cheque-dentista só foi usado por 3,5% dos idosos beneficiários
21 de ago. de 2018, 10:44
— Lusa/AO Online
No ano passado, o programa de saúde oral contratou 4.678 dentistas
espalhados por 8.641 clínicas do país, uma cobertura elevada, que varia
entre 97,7% no Norte e 89,4% no Algarve.
Contudo, a sua abrangência apresenta variações conforme a
população-alvo: enquanto nas crianças e nos adolescentes a cobertura se
situa nos 95% e nas grávidas em 63%, nos idosos baixa para os 3,5%. “São
um grupo muito vulnerável da população, com alfabetização reduzida e
podem não estar plenamente conscientes do seu direito ao uso do
cheque-dentista”, afirma Jorge Simões, um dos autores do programa, num
artigo publicado no Health Policy Journal, que avalia os dez anos do
cheque-dentista.
Em declarações à agência Lusa, o diretor da Unidade de Saúde Pública
Internacional e Bioestatística do Instituto de Higiene e Medicina
Tropical, explicou que o acesso ao programa “pressupõe conhecimento”, o
que coloca os idosos em desvantagem em relação a outros grupos
beneficiários do programa financiado pelo Serviço Nacional de Saúde
(SNS).
Enquanto as crianças e os adolescentes recebem os seus vales
automaticamente nas escolas públicas e estão ao alcance dos serviços de
saúde, as grávidas, os idosos e os portadores de VIH/Sida têm de revelar
a sua condição para receber o cheque-dentista, explicou.
Para inverter esta situação, o especialista defendeu que deve haver
uma “maior preocupação” por parte da equipa de saúde que acompanha o
idoso em saber a sua condição e informá-lo sobre os seus direitos, tal
como os párocos e as outras confissões religiosas podem anunciar nas
paróquias que existe o cheque-dentista e a quem se destina.
Fazendo um balanço dos 10 anos da medida, Jorge Simões destacou como
“aspetos mais positivos” já ter abrangido 3,3 milhões de portugueses e
ter “melhorado drasticamente” os indicadores de saúde oral.
Entre 2006 e 2013, o indicador de dentes cariados, perdidos e
obturados diminuíu 20% nas crianças de 12 anos. “Se podemos dizer que há
um nexo de causalidade óbvio, absoluto entre cheque-dentista e esta
descida, não. O que podemos dizer é que seguramente também se deve ao
cheque-dentista esta descida tão significativa”, frisou. No
artigo, Jorge Simões e os outros autores afirmam que, embora o programa
tenha uma natureza não universal, que pode pôr em risco “o princípio do
acesso universal” a cuidados de saúde pública, a sua cobertura tem sido
alargada, tendo em conta os grupos mais vulneráveis e a necessidade de
prevenção e de tratamento precoce das doenças orais mais graves.“Quando
o SNS não pode, por razões financeiras, dar uma resposta a todos os
cidadãos, então é preferível, sem demagogias, dizer ‘eu vou
progressivamente alargando esta resposta, mas vou começando pelos grupos
prioritários’ e eu julgo que as escolhas foram bem feitas”, considerou à
Lusa. No
entanto, a medida deixa de fora potenciais beneficiários como crianças e
adolescentes que frequentam escolas privadas ou idosos que recebem
reformas baixas, mas insuficientes para acederem a benefícios sociais.
Mas, adverte, a expansão do cheque-dentista ou de outras formas de
prestação de cuidados de saúde oral pode “ser prejudicada pela
necessidade de conter custos e alcançar a sustentabilidade financeira no
SNS”.