Centeno diz que inflação é mais injusta do que medidas para a combater
18 de set. de 2023, 09:59
— LUSA/AO online
"Pensamos que se as mantivermos [as taxas de
juro do Banco Central Europeu] neste nível, faremos algo determinante
para a inflação poder convergir para 2%, que é o nosso objetivo. O mais
importante, neste momento, era dar alguma previsibilidade para nos
podermos adaptar ao que nos espera nos próximos meses", disse Mário
Centeno ao jornal espanhol El Pais, numa entrevista publicada hoje.A
entrevista foi concedida depois de na quinta-feira o Banco Central
Europeu (BCE) anunciar uma nova subida das três taxas de juro diretoras
em 25 pontos base, colocando a taxa dos depósitos no nível mais elevado
de sempre da zona euro.Mário Centeno
admitiu ao El Pais que o "risco de fazer demasiado está sempre presente
na política monetária", como já aconteceu em 2008 e 2011, quando o BCE
"teve de fazer marcha-atrás porque a subida das taxas de juro não era
compatível com a estabilidade dos preços, financeira e da economia"."Esse risco é real e temos de estar atentos", disse.Questionado
se foi partidário de parar agora a subida das taxas do BCE, Centeno
respondeu: "Não podemos desviar-nos deste caminho porque a inflação é
mais regressiva e injusta socialmente do que as medidas que usamos para a
combater, que com frequência são duras e prejudicam a economia. O
problema é que a inflação também. No conselho de governo [do BCE]
tentamos gerir este equilíbrio difícil".Para
o governador do Banco de Portugal, "a chave para continuar a baixar a
inflação e resistir à subida das taxas de juro é o mercado laboral, que
está em máximos históricos" na Europa."É
quase uma obrigação de todas as políticas, também da monetária, proteger
este novo 'statu quo', que nos afasta do estigma da estagflação",
afirmou.Mário Centeno acrescentou que para
evitar "grandes crescimentos de desemprego e problemas sociais" é
necessária "a previsibilidade e a coordenação de políticas", embora
reconhecendo que a situação não é uniforme em todos os países da União
Europeia."A política monetária é única,
apesar de sabermos que o seu impacto é diferente. Para isso, há a
política orçamental e foi isso que conseguimos durante a covid e o
aumento dos preços da energia", defendeu, acrescentando que os bancos
centrais recomendam que "a política orçamental mantenha o apoio seletivo
aos mais vulneráveis porque há margem na política fiscal para o fazer".Questionado
sobre o impacto da subida das taxas de juro em países como Espanha e
Portugal, onde há grande peso dos empréstimos à habitação com taxas de
juro variáveis, Centeno respondeu que os bancos centrais apelam "à
capacidade de poupanças preexistentes e a um ajustamento na forma como
nas famílias se gere o orçamento"."Mas
sabemos que isto é mais fácil de fazer se soubermos como vai ser o
futuro. A gestão de expectativas é aquilo que também devemos fazer com a
política monetária para dar previsibilidade. E foi isso que conseguimos
na quinta-feira, uma fase que nos dá previsibilidade, um compromisso
que as famílias europeias mereciam. Depois, há os apoios públicos que
têm quase todos os países", acrescentou.Sobre
os grandes lucros dos bancos neste contexto e a possibilidade de a
banca contribuir nos apoios às famílias, Centeno disse que "parte disto é
cíclico" e "os bancos têm de ficar com uma parte substancial destes
lucros, porque podem ter de responder à deterioração potencial dos
empréstimos", que atualmente não se vê "porque o mercado laboral é
forte"."O problema para a banca é que os
seus ciclos têm uma correlação difícil de entender para os cidadãos",
que sentem "mais pressionados" quando "os bancos estão bem", defendeu.