Capacitar mulheres emigrantes foi a missão de Paula Raposo

17 de set. de 2023, 00:00 — Ana Carvalho Melo

Natural de Ponta Delgada, Paula Raposo emigrou para Fall River, nos Estados Unidos, na década de 60, onde desempenhou um papel significativo na capacitação da comunidade de emigrantes açorianos, com foco especial nas mulheres.  A aventura de Paula Raposo nos Estados Unidos começou aos 18 anos, quando ela emigrou para Fall River com o seu marido. Apesar da sua juventude e falta de familiaridade com o novo país, Paula Raposo inicialmente trabalhou numa fábrica de confeções. No entanto, o seu desejo de melhorar de vida levou-a a ingressar no Departamento Escolar de Fall River.“Foi a partir daí que comecei a desempenhar um papel importante na comunidade de emigrantes de Fall River. Trabalhando numa escola pública e numa área com muitos emigrantes dos Açores e onde o diretor da escola não falava português, comecei a ajudar a nossa gente”, partilha.Essa experiência levou-a a ser convidada para ser a gestora do projeto SER - Jobs for Progress, que tinha como objetivo auxiliar os emigrantes na integração no sistema escolar.  “Eu adorava esse trabalho, mas um vizinho meu que trabalhava na organização nacional SER - Jobs for Progress percebeu o meu comprometimento com os emigrantes e convidou-me para trabalhar no escritório do projeto em Fall River”, conta, explicando que este projeto, criado durante a presidência de Jimmy Carter, tinha como objetivo ajudar jovens de famílias emigrantes a integrarem-se no mercado de trabalho após concluírem a escolaridade.  Paula Raposo abraçou esse novo desafio em 1978 e ajudou muitos jovens emigrantes a integrarem-se no mercado de trabalho após concluírem a escolaridade. “Os pais queriam que eles trabalhassem, mas os jovens também queriam estudar. Portanto, encontramos empregos para eles após a escola, permitindo que continuassem os seus estudos e contribuíssem para suas famílias”, recorda.O que começou como um pequeno projeto cresceu ao longo dos anos, apoiando não apenas emigrantes jovens, mas também adultos. Ofereciam aulas de inglês em fábricas, antes ou depois dos turnos, e em diferentes partes da cidade para facilitar o acesso. Eventualmente, conseguiram até adquirir um edifício próprio. Tudo isso também envolveu serviços sociais, preenchendo uma lacuna que também Paula Raposo tinha enfrentado quando chegou aos Estados Unidos.Em especial Paula Raposo reconhece que teve em atenção as mulheres emigrantes.“Eu promovi as mulheres. Foi sempre a minha intenção garantir que outras mulheres tivessem as oportunidades que eu nunca tive quando cheguei a Fall River”, afirma, recordando: “A vida de um emigrante é sempre muito difícil”.Mais tarde, houve a possibilidade de implementar um programa para mães jovens que não tinham acabado o ano do liceu.  “Elas não tinham transporte ou quem ficasse com os filhos e nós arranjamos uma carrinha para as transportar e mais tarde abrimos uma creche. Para mim toda a criança que vem com a mãe para a escola não vai deixar a escola”, recorda.Atualmente, os serviços da SER incluem aulas para obtenção do GED (Certificado de Conclusão do Ensino Médio), treino em informática, colocação no mercado de trabalho, desenvolvimento de habilidades empresariais, preparação para a cidadania e um programa para pessoas que desejam ingressar na indústria de seguros.“Devemos defender a educação básica para adultos”, diz, realçando: “Ainda temos muitos adultos que não possuem as capacidades necessárias para as oportunidades de emprego de hoje em dia.”Como reconhecimento de todo o trabalho desenvolvido na comunidade, Paula Raposo conta que acabou por ser convidada a integrar organizações de prestígio, como a Câmara de Comércio de Fall River de que foi presidente em 1988-1989.  “Eu fui a primeira em muitas coisas”, conta, lembrando que foi a primeira mulher a tornar-se membro do Rotary Club de Fall River em 1987, assim como a primeira emigrante a integrar os conselhos de diretores da Câmara de Comércio de Fall River, do Bank 5 em 1980 e do Charlton Memorial Hospital, em 1996.  “Tive um papel interessantíssimo no banco porque como emigrante abri as portas a muitos outros. Já no hospital fiz pressão para fazerem as traduções dos documentos em português”, conta, realçando que todo este trabalho foi, muitas vezes, “uma luta”.O trabalho que realizou ao longo da sua vida foi também reconhecido em Portugal tendo em 1988 sido agraciada pelo Presidente da República Mário Soares com a Comenda da Ordem de Mérito.Ainda na sua experiência como mulher, emigrante e pioneira, em 1984, o Presidente Ronald Reagan nomeou Paula Raposo para ser a primeira mulher em 50 anos a servir no Comité Federal de Aprendizagem do Departamento de Trabalho dos Estados Unidos.