Candidatos criticam dificuldades no acesso à justiça que descredibiliza instituições
Presidenciais
18 de jan. de 2021, 16:01
— Lusa/AO Online
"Não
basta fazer, como fez o senhor professor Marcelo Rebelo de Sousa, um
discurso no início do ano judicial em 2016, com um pacto para a justiça,
que depois não valeu o papel onde estava escrito, com 80 medidas,
muitas absolutamente relevantes mas que não foram concretizadas",
salientou Ana Gomes, no último debate antes das eleições presidenciais
emitido hoje em simultâneo por TSF, Antena 1 e Renascença, ao qual André
Ventura faltou alegando "motivos de agenda".A
candidata apoiada pelo Livre e pelo PAN alertou para "um bloqueio em
relação à justiça", considerando que "o que os portugueses veem é o
acesso à justiça ser negado aos pobres" e os "ricos manipularem a
justiça, fazerem com que haja mega processos e outros esquemas para
trabalhar para a prescrição dos crimes, para nunca serem julgados". Ana
Gomes voltou a uma das suas bandeiras, e pediu também "justiça
exemplar" para a corrupção, estimando que "mil milhões de euros por ano"
sejam "desviados do erário público português para 'offshores'".Apontando
que esta é uma das áreas em que o Presidente da República pode fazer a
diferença, a antiga diplomata advogou que não viu "nada" ser feito por
parte do atual chefe de Estado. "Há um
enorme número de portugueses que hoje não têm acesso à justiça, seja
porque esta é cara, muito cara, seja porque os meios de patrocínio
judiciário que a Constituição define não funcionam", concordou João
Ferreira, atirando que "é uma realidade" a ideia de que "há uma justiça
para pobres e uma justiça para ricos" e salientando a falta de meios
neste setor.O candidato apoiado pelo PCP
alertou para a autonomia do poder judicial, notando que "há aspetos do
chamado pacto para a justiça promovido pelo Presidente da República que
são problemáticos", nomeadamente no que toca à autonomia do Ministério
Público.O comunista rejeitou também a delação premiada, advogando que "serve mais para absolver criminosos"."Concordo
que o pacto para a justiça não saiu do papel", afirmou Marisa Matias,
que alinhou também na rejeição da delação premiada.A candidata apoiada pelo BE salientou, além do acesso igualitário que "não existe e deveria existir", a morosidade da justiça."Em
relação ao grande crime, a justiça nunca mais decide", lamentou,
pedindo meios e condições profissionais para que as investigações possam
ser mais rápidas e para contrariar uma justiça a "duas velocidades".Neste
tema, também Ana Gomes interveio para rejeitar a delação premiada,
defendendo ao invés "colaboração com controlo judicial", como acontece
com o 'hacker' Rui Pinto.Em matéria de
justiça, Tiago Mayan Gonçalves criticou a atuação de Marcelo Rebelo de
Sousa no que tocou à não recondução da antiga procuradora-geral da
República Joana Marques Vidal e no caso da polémica nomeação do
procurador europeu José Guerra."São dois exemplos muito claros em que o senhor Presidente da República poderia e deveria ter tido um papel", salientou.Para Vitorino Silva "a justiça é cega, mas o povo não é cego" e sabe "o que é ficção e o que é realidade".Na
resposta, Marcelo Rebelo de Sousa reconheceu que "realmente o pacto só
muito parcialmente foi aplicado", nomeadamente na digitalização, da
"funcionalização da justiça cível e comercial" ou na "melhoria do
estatuto das magistraturas", mas considerou que "a lentidão continua a
ser um problema".O candidato e atual
Presidente da República destacou que a sua proposta "conseguiu ter o
apoio de todos os parceiros judiciais", mas lamentou que "os parceiros
políticos não aplicaram muito esse pacto naquilo que era mais fácil
aplicar".Marcelo concordou que "era
preciso reforçar os meios, reformular o DCIAP" [Departamento Central de
Investigação e Ação Penal], disse "ser sensível" à autonomia do
Ministério Público, e salientou que "há um problema de fundo" no que
toca às 'offshore'.Num debate no qual
André Ventura não esteve presente, a solução governativa encontrada no
Governo Regional dos Açores, que junta PSD, PPM, CDS-PP, Iniciativa
Liberal e Chega, foi novamente tema, com os candidatos a reforçar as
posições já conhecidas sobre a matéria e o Presidente recandidato a
deixar alguns avisos. Marcelo Rebelo de
Sousa lembrou que, em 2015, o seu antecessor, Aníbal Cavaco Silva,
exigiu um acordo escrito entre a 'geringonça' de PS, PCP e BE, algo que
não se verificou em 2019, uma vez que o atual chefe de estado “não tinha
dúvidas” sobre a constitucionalidade dos partidos. “Em
relação aos Açores as dúvidas podiam levantar-se, e embora o processo
fosse conduzido pelo representante da República no exercício dos seus
poderes, ele fez muito bem em exigir acordos escritos porque havia
dúvidas”, argumentou.Marcelo clarificou ainda que a nível nacional, “havendo dúvidas sobre o comportamento, aí faz sentido haver acordos escritos”.“Se
for essa a situação, se ela vier a acontecer. Mas acontecerá mais
depressa se nós transformarmos em polo central da vida política
portuguesa o que não deve ser”, alertou.As
eleições presidenciais, que se realizam em plena epidemia de covid-19
em Portugal, estão marcadas para 24 de janeiro e esta é a 10.ª vez que
os portugueses são chamados a escolher o Presidente da República em
democracia, desde 1976.A campanha
eleitoral termina em 22 de janeiro. Concorrem às eleições sete
candidatos, Marisa Matias (apoiada pelo Bloco de Esquerda), Marcelo
Rebelo de Sousa (PSD e CDS/PP) Tiago Mayan Gonçalves (Iniciativa
Liberal), André Ventura (Chega), Vitorino Silva, mais conhecido por Tino
de Rans, João Ferreira (PCP e PEV) e a militante do PS Ana Gomes (PAN e
Livre).