Banco Invest confirma que compra de ações da ESFG foi contrapartida a financiamento
BES
14 de jan. de 2020, 18:58
— Lusa/AO Online
Afonso de
Sousa depôs hoje como testemunha no julgamento do recurso interposto no
Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS) pelo
ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, e pelo antigo administrador José
Castella à decisão do Banco de Portugal (BdP), que os condenou, em julho
de 2019, a coimas de 75.000 e 50.000 euros, respetivamente.Em
causa no processo está, nomeadamente, a violação das normas que
obrigavam a desconsiderar do cômputo de fundos próprios, em base
consolidada, as ações adquiridas pelas 'holdings' do Grupo Alves Ribeiro
(GAR, dono do Banco Invest) aquando do aumento de capital da Espírito
Santo Finantial Group (ESFG), em 2012.Afonso
de Sousa relatou as circunstâncias em que se deu a abordagem a Ricardo
Salgado, em 2008, altura em que o Banco Invest enfrentava
“constrangimentos de tesouraria”, fruto da crise do ‘subprime’,
necessitando “urgentemente” de uma verba de 50 milhões de euros.Num
almoço realizado no final de outubro de 2008, Ricardo Salgado terá
mostrado disponibilidade para conceder o financiamento pretendido, mas
colocou como condição que fosse feito um investimento de igual valor
numa das ‘holdings’ do Banco Espírito Santo, operação que o BES
financiaria e que não comportaria risco para o GAR, afirmou.Segundo
Afonso de Sousa, os detalhes das operações foram tratados nas semanas
seguintes com intervenção direta do administrador Amílcar Morais Pires e
do seu dependente hierárquico Alberto Diniz, tendo sido concretizadas
em dezembro desse ano.Assim, foram
assinados dois contratos de financiamento, um no valor de 30 milhões de
euros, concedido por um ano e sem garantias ao Banco Invest, e outro de
20 milhões de euros, a três anos, com garantia, à 'holding' que detém o
banco, a ARIF (Alves Ribeiro Investimentos Financeiros).Quanto
aos contratos com as quatro 'holdings' que detêm a ARIF, de concessão
de 50 milhões de euros (12,5 milhões a cada uma), Afonso de Sousa
confirmou que se destinaram à aquisição de ações da ESFG e que foram
celebrados ‘swaps’ que transferiam todo o risco para a Espírito Santo
Internacional (ESI).Afirmando que foi
claro que o grupo só obteria o financiamento de que necessitava se
aceitasse esta operação, Afonso de Sousa afirmou que, desde o início,
teve a “sensação” de que esta condição foi colocada porque o BES “teria
algum interesse em estabilizar a base de acionistas”.O
banqueiro afirmou que, no final de 2011 (término do contrato), era
vontade do GAR encerrar esta operação, o que não aconteceu porque, com a
desvalorização das ações da ESFG, havia o risco de existir um encargo
fiscal, pelo que foi prolongada, tendo, no início de 2012, havido um
contacto por parte de Alberto Diniz para que o GAR participasse no
aumento de capital que a ESFG iria realizar em abril.Essa
participação, de 20 milhões de euros (cinco milhões em cada uma das
quatro ‘holdings’ do GAR) acabou por fazer-se nos mesmos moldes em que
havia acontecido em 2008, com financiamento do BES e contratos de ‘swap’
com a ESI, tendo os interlocutores sido Morais Pires e Alberto Diniz,
disse.Segundo o banqueiro, ficou claro
que, se não participassem no aumento de capital da ESFG, seria fechada a
linha de financiamento ao Banco Invest.Afonso
de Sousa afirmou que a operação, embora imposta, era legítima e não
comportava riscos, frisando que, na altura, o BES era “muito credível”.Segundo
disse, além do primeiro almoço, só voltou a encontrar-se com Ricardo
Salgado em junho de 2014, quando se soube que iria haver mudanças na
administração do BES, para pedir que fosse dado conhecimento do
“contexto” da operação ao futuro presidente.O
banqueiro afirmou que foi o próprio que deu conta da operação a Vítor
Bento e ao Banco de Portugal, dias depois de ter sido anunciada a
resolução do BES, em agosto de 2014, tendo solicitado que o crédito
permanecesse no BES e não transitasse para o Novo Banco, já que aquele
se tinha comprometido a assumir todos os riscos.Afonso
de Sousa afirmou que a única reunião que teve com José Castella
aconteceu já em 2015, quando o Novo Banco interpôs uma ação contra o GAR
para tentar cobrar os créditos.Na
primeira sessão do julgamento, no passado dia 26 de novembro, Ricardo
Salgado disse que não havia qualquer interesse ou necessidade de
esconder as ações adquiridas pelo Grupo Alves Ribeiro aquando do aumento
de capital da ESFG.O ex-presidente do BES
pediu a junção de um documento no qual listou as nove operações de
aumento de capital da ESFG, desde a sua fundação, no Luxemburgo, em
1984, assegurando que no final de 2013 o capital e reservas totalizavam
1,5 mil milhões de euros após a dedução de 700 milhões de euros da
provisão imposta pelo BdP para fazer face ao risco reputacional do papel
comercial.Ricardo Salgado afirmou que
“não havia necessidade de ocultar nada”, porque o rácio de solvência
cumpriu sempre os limites nacionais e europeus.