Baixos salários estão a causar dificuldades aos trabalhadores da saúde na Venezuela
2 de fev. de 2023, 13:52
— Lusa/AO Online
“Estamos nas ruas para exigir um salário digno para os trabalhadores da saúde, de cada hospital”, disse uma porta-voz do setor.Sílvia
Bolívar falava à Lusa, em Chacaíto (leste de Caracas), durante uma
concentração de enfermeiros, professores, profissionais de outros
setores e reformados para exigir melhores salários.“Como
pode um trabalhador ir trabalhar todos os dias para receber (um
ordenado de) sete dólares [seis euros] por mês e ainda exigem uniformes,
sapatos e horários de trabalho”, questionou.Sílvia
Bolívar insistiu que os profissionais da saúde e de outros setores vão
continuar nas ruas, também para denunciar os atropelamentos de que são
alvo, de parte de organizações e de “coletivos” [motociclistas armados
afetos ao regime] quando saem em protestos, para impedir que "digam a
verdade.“Temos bastantes trabalhadores que
se desmaiam de fome, que não têm como alimentar os seus filhos (…) que
deixaram de trabalhar nos hospitais para vender café e doces nos
autocarros, porque isso dá muito mais do que um salário mínimo diário”,
explicou.Sílvia Bolívar disse que “é
doloroso” porque há 23 dias que aqueles profissionais realizam protestos
e não recebem resposta do Governo, por isso diferentes setores estão a
unir-se contra “um sistema que atropela todos por igual”.A
enfermeira referiu que, recentemente, foi apontada a possibilidade de
elevar os salários a 50 dólares [45 euros] mensais, mas com o pagamento
em bolívares, "que se desvalorizam" e são "devorados pela inflação".“Falam
de um bloqueio [económico contra o país] que não existe. Aqui há de
tudo. Está a ‘Avanti’ [loja de produtos de luxo inaugurada em Caracas] e
grandes carrinhas que nenhum trabalhador, enfermeira ou professor, tem
porque somente eles [do regime] comem bem, vivem bem e nós, os
venezuelanos, não temos direitos à educação, à saúde, a ter uma casa
própria”, acusou.A trabalhar há mais de 20
anos na Maternidade Concepción Palácios, Sílvia disse sentir dor
“porque agora chegam muitas raparigas desnutridas para dar à luz”. As
crianças podem morrer de desnutrição, de doenças ou patologias que os
pais não vão ter como responder, acrescentou.“Temos visto companheiros que os filhos morreram porque não têm como dar-lhes sustento”, frisou.Na
concentração estava também Ofélia Rivera, coordenadora de trabalhadores
do setor educativo, que destacou que os professores vão vítimas de
perseguição e assédio no país, onde pais e encarregados de educação são
usados para aterrorizar os professores.“Felizmente, os pais e professores estão a organizar-se em muitas cidades e povoações”, disse a professora reformada.A Venezuela está a passar por uma crise humanitária, que também está a afetar as crianças, considerou.“O
baixo salário incide na capacidade de comprar alimentos (…) temos mais
de 30% de afetados com desnutrição nas povoações mais distantes do país e
isto é grave”, concluiu.Carlos Timaure,
funcionário da UCV, quer ver compensada a “pulverização do salário dos
trabalhadores”, de modo a que o rendimento atual, de cinco dólares (4,5
euros) mensais, esteja em correspondência com o cabaz básico alimentar
que ronda os 500 dólares (455 euros).“Exigimos
um aumento geral dos salários, a liberdade dos que foram presos por
lutar, que se cumpra a Constituição, o direito a viver dignamente”,
disse.Timaure indicou que o ordenado é
insuficiente para comprar medicamentos, referindo que os economistas
estão a advertir para um regresso do país à hiperinflação.“O
salário está ancorado à miséria, à fome e à pobreza. 90% da população
venezuelana está em situação de pobreza, num país que tem todos os
recursos do mundo, entre eles petróleo, ouro e diamantes”, destacou.