Ativistas insatisfeitos com resposta de Joe Biden à revogação do direito ao aborto
29 de jul. de 2022, 16:02
— Lusa/AO Online
Em causa está a lentidão da
resposta e os limites da sua abrangência, numa altura em que vários
estados baniram completamente o acesso ao aborto na sequência da
sentença Dobbs v. Jackson Women's Health Organization, que revogou o
precedente Roe v. Wade. Apesar de ter sido
criada em setembro de 2021 uma equipa de resposta à possível revogação
do direito ao aborto, dentro do Gender Policy Council (Conselho de
Política de Género), a ação pós-decisão foi considerada letárgica. O
presidente Joe Biden demorou seis dias a declarar o apoio à mudança
excecional das regras no Senado para aprovar legislação federal que
proteja o direito ao aborto, e levou duas semanas a assinar uma ordem
executiva com medidas para mitigar a revogação. A
administração não declarou uma emergência de saúde pública nem avançou
com o fornecimento de serviços abortivos em territórios federais, o que
levou a críticas de que a ação está a ser mais fraca que o esperado. A
organização Women’s March (Marcha das Mulheres), criada originalmente
em 2017 para protestar contra Donald Trump, iniciou uma petição neste
sentido. “Estamos a pedir ao presidente Biden que declare um estado de
emergência para proteger o acesso ao aborto”, informou. A
mesma organização anunciou esta semana que vai mobilizar “milhares” de
pessoas para um “fim de semana de luta” com manifestações em Washington,
D.C. e por todo o país, de 07 a 09 de outubro. Também
esta semana, a Vanity Fair publicou um artigo citando o
descontentamento de ativistas, as posições de oficiais da Casa Branca
que falaram anonimamente e a visão de congressistas democratas. A
tensão entre ativistas e a Casa Branca tinha atingido o pico quando a
diretora de comunicação Kate Bedingfield criticou a ala mais à esquerda
da base de apoio do partido Democrata, em declarações ao Washington
Post. “O objetivo de Joe Biden na resposta
a Dobbs não é satisfazer alguns ativistas que têm estado
consistentemente fora de passo com a corrente dominante do Partido
Democrata”, declarou. “É ajudar as mulheres que estão em perigo e montar
uma coligação de base ampla para defender o direito de uma mulher a
escolher, tal como montou uma coligação para vencer na campanha de
2020”.Biden, que esteve em isolamento
depois de testar positivo à covid-19, fez várias declarações sobre o
aborto e a necessidade de eleger mais congressistas e senadores
pró-escolha para poder codificar a legislação. As
eleições intercalares de novembro vão decidir o Controlo do congresso e
os republicanos já prometeram trabalhar para restringir ainda mais o
acesso ao aborto se ganharem. Mas os analistas não estão certos que a questão do aborto seja a mais influente para os eleitores na hora de votar. “As
pessoas têm memória curta e por pior que tenha sido a revogação de Roe
v. Wade, em novembro as pessoas vão pensar em quanto gastam em gasolina,
como está a inflação e as taxas de juro”, disse à Lusa o cientista
político Everett Vieira III. O reitor
interino da Faculdade de Ciências Sociais na Universidade Estadual da
Califórnia em Fresno, Jeffrey Cummins, também apontou para a economia e
inflação como fatores mais relevantes. “Ainda não sabemos qual será o
impacto da revogação do direito ao aborto”, indicou. Por
outro lado, o apelo reiterado ao voto caiu mal entre ativistas que
apontaram para o facto de já ser previsível há algum tempo que o Supremo
ia revogar o direito ao aborto. “É
indesculpável para a liderança democrata saber há meses que isto ia
acontecer e convocar uma resposta tão anémica”, disse ao New York Times
Stephanie Taylor, fundadora do Progressive Change Campaign Committee. Também
a presidente da Women’s March, Rachel O’Leary Carmona, criticou o apelo
ao voto como refrão na resposta ao que está a acontecer. “Não
nos digam para votar sem dizer qual é o plano”, escreveu na sua conta
de Twitter. “A reforma do Supremo está em cima da mesa? A codificação de
Roe? Estamos a votar em quê?”, questionou. “Se
a vossa solução para o ataque aos nossos direitos é dizer às pessoas
para votar mas não porque é que precisam de mais votos no Congresso e o
que farão com mais votos, então essa não é uma boa receita para
incentivar à participação”, considerou, noutra publicação. A
Women’s March também tem mantido a pressão. “Caros democratas: vocês
disseram-nos para votar. Demos-vos a Câmara, o Senado e a Presidência”,
salientou. “Quando votarmos novamente em novembro, é bom que tenham um
plano incrível para restaurar os nossos direitos humanos fundamentais”.