Assistencialismo e exploração impedem erradição da pobreza
Pobreza
17 de out. de 2023, 09:47
— Lusa/AO Online
“A pobreza não se resolve só
com o emprego. Os que trabalham não têm um salário suficiente para as
suas despesas, há aqui uma exploração de trabalho, de mão-de-obra,
porque as pessoas trabalham, trabalham, mas com o seu salário não
conseguem sustentar a sua família. Este é outro aspeto que é preciso
clarificar em Portugal, temos políticas muito assistencialistas e é o
que se verifica neste atual orçamento”, afirmou o padre Jardim Moreira,
em declarações à agência Lusa.De
acordo com o responsável pela EPAN em Portugal, o aumento do custo de
vida está a afetar a faixa da população tradicionalmente mais vulnerável
e a gerar novos problemas: “A classe média, que começa a não ter
capacidade de manter o estatuto que tinha, nem a capacidade que tinha de
manter as suas próprias habitações. É toda uma vida que se reduz a
despesa”.“Com a inflação o dinheiro não
chega. As pessoas têm de reduzir as compras. De um modo geral, quem
padece mais é a família, porque a casa era grande e vai passar para uma
pequena, porque deixa de ter dinheiro para algumas atividades, todos vão
ter de cortar”, acrescentou.O presidente
da EPAN Portugal, entidade que está a desenvolver uma campanha centrada
nos dois milhões de pobres que existem no país, destacou que 40% dos
pobres portugueses são trabalhadores. “Sabemos
também que 10% dos trabalhadores portugueses estão em risco de pobreza.
Quer dizer que esta corrente ideológica de que a pobreza se resolve só
com emprego não é verdade”, observou.Segundo
os dados apresentados na campanha da EPAN, 339.000 crianças vivem em
situação de pobreza ou exclusão social, uma condição que afeta 502.000
idosos.Para Jardim Moreira, é necessária “coragem política” para adotar medidas estruturais. “Aumenta
o salário mínimo, aumentam várias medidas, mas não saímos da mesma
linha de assistencialismo, quando hoje já se entendeu que para lutar
contra a pobreza é preciso proporcionar às pessoas o seu desenvolvimento
integral, de todas as suas potencialidades e capacidades, por forma a
que ela se sinta feliz na vida, naquilo que é, naquilo que faz”,
sublinhou.“Ora, se estamos apenas a dar
subsídios, subsídios, subsídios, ficam sempre dependentes e incapazes de
poder sair. De tal forma que nós sabemos que em Portugal é preciso
cinco gerações para sair da pobreza. Significa que a pobreza é
estrutural e as medidas se não forem estruturais apenas mantêm as
pessoas na sua situação. Podem dar mais dinheiro, mas também subiu o
custo de vida, das necessidades e subiu a inflação. O dinheiro que
recebem vai cobrir, se é que cobre, a diferença”, prosseguiu o padre que
dirige a EPAN em Portugal.Na opinião do
sacerdote, é necessária uma mudança de modelo económico. “Para que haja
uma intervenção de fundo é preciso decidir e ter como base se queremos
organizar e orientar a sociedade a partir do lucro ou a partir da pessoa
humana”, referiu. “A pobreza que
mantemos agora e as políticas que temos agora não possibilitam a
participação das pessoas em situação de pobreza na solução dos seus
problemas, estamos contra a pessoa humana, o ser humano é um ser que
existe em relação. Não pode relacionar-se com ninguém, é a comida que
lhe dão, tem de comer aquela”, declarou Jardim Moreira.