20 de nov. de 2023, 11:12
— Rafael Dutra/Ana carvalho Melo
O tempo escurece e os dias são cada vez mais curtos.
Ainda estamos no mês de novembro, mas a época de Natal está cada vez
mais próxima. As tradições natalícias continuam bem vincadas nos Açores.
Os presépios tradicionais feitos com bonecos são uma tradição que não
escapa a muitos lares, e é nesta altura em que há um maior número de
encomendas aos bonecreiros da Região, como é o caso de João Arruda.Natural
da Lagoa, João Arruda tem 56 anos e trabalha no Museu Municipal deste
concelho, na oficina de bonecreiro. O lagoense desde criança demonstrou
“imenso gosto” em fazer presépios e também “muita curiosidade em fazer
bonecos”, que preparava sem molde. No entanto, João Arruda, em
entrevista ao Açoriano Oriental, explica que só se dedicou totalmente a
ser bonecreiro e artesão mais tarde na sua vida, após um problema de
saúde “complicado”, que lhe impossibilitou a continuação no antigo
trabalho.Foi uma mudança súbita e um processo de aprendizagem que
não foi fácil. O bonecreiro admite que teve de aprender esta arte e,
para o conseguir, frequentou várias formações e workshops, e até
aprendeu com outros bonecreiros. É uma aprendizagem contínua: “estamos
sempre aprendendo”, sustenta o artesão, que tem a sua própria oficina,
onde iniciou o seu trajeto na arte bonecreira.Já quanto à produção
de bonecos, diz também que é um processo difícil e que requer “muita
paciência”. Primeiro há a questão de fazer o molde, que depois tem de
ser retirado e limpo. Os bonecos posteriormente passam por um período em
que têm de secar, e depois por um processo de cozedura. Só então é que
passa à parte da pintura, e aí tem de pintar umas cores, deixar secar e
pintar outras, até chegar ao produto final. “Hoje temos técnicas e tinta
com melhor qualidade, mas leva o seu tempo”, refere.O bonecreiro
diz ainda que depois de fazer o molde é que tem a maior parte do
trabalho, visto que “cerca de 75%” é feito com as mãos. “Cada um
aperfeiçoa à sua maneira e faz os acabamentos que gosta”, podendo
aproveitar os moldes ou modificar os bonecos conforme a sua imaginação,
conta João Arruda, destacando ainda que é um trabalho minucioso, mas
prefere “aperfeiçoar os bonecos o máximo possível”, porque valoriza mais
a qualidade do que produz do que a quantidade.Atualmente trabalha
no Museu da Lagoa, onde dá formações, explica a arte bonecreira aos
visitantes e faz bonecos para o museu, porque há lá uma pequena loja que
os vende, e produz ainda para outras atividades da Câmara, caso seja
preciso. No entanto, não abdica do seu atelier, onde também fabrica
estes bonecos, nos seus tempos livres.Felizmente, e apesar de
estarmos a chegar à época do Natal, onde há muitas encomendas e os
bonecreiros vendem mais, João Arruda afirma que os bonecos tradicionais e
os presépios de lapinha estão na “moda”. E, por isso, durante o ano,
tem bastantes clientes: colecionadores, emigrantes, e até comerciantes
locais, que compram para depois vender aos seus clientes. O artesão
também exporta para outros sítios do mundo. “As pessoas têm gosto em
ter um presépio com bonecos tradicionais da sua terra”, realça.Embora
considere que não seja possível viver da arte bonecreira, e que a mesma
é apenas um suplemento, João Arruda reconhece que para trabalhar nesta
área “é preciso ter gosto, dedicação e paciência. Não se consegue viver
só com o dinheiro da venda dos bonecos”, salienta.Não obstante esta
condicionante financeira, é possível verificar um acréscimo no número de
bonecreiros em São Miguel, muito devido ao município da Lagoa, que tem
apostado na formação de artesãos e bonecreiros, inclusive através de
iniciativas como o projeto ‘Novos Bonecreiros’. Por esta razão, e
questionado sobre o futuro da arte bonecreira, João Arruda confessa que
já esteve “mais pessimista”, e que agora está “mais satisfeito”, porque a
“Câmara da Lagoa conseguiu, e nós conseguimos formar novos
bonecreiros”, conclui.