Arquipélago de Escritores faz ligação entre música e literatura
6 de out. de 2022, 10:33
— Eduarda Mendes/ Arquipélago de Escritores
Está de regresso mais uma edição do Arquipélago de Escritores, o que tem movido a organização deste evento ao longo destes 5 anos?Antes de mais, a valorização da escrita nos Açores. E quem diz a escrita diz a leitura, claro. Os Açores têm uma importante tradição literária, com nomes de grande qualidade, alguns deles pouco conhecidos, que merecem ser valorizados e celebrados.Pela nossa posição no mapa, somos também um lugar privilegiado para receber vozes várias e diversos imaginários.Ao fim de cinco anos temos consagrado o objetivo inicial: celebrar, de diferentes maneiras, de conversas e filmes a revistas e homenagens, a literatura nos Açores. A nossa, a de outros sítios. E quando digo Açores digo as nove ilhas e os territórios da emigração. É preciso merecer o qualificativo de açoriano.Em todas as edições tem havido uma espécie de tema/mote, este ano qual é o principal foco do Arquipélago?Este ano trouxemos uma componente musical importante. Porque escrever letras é uma forma de escrita, muita dela com componente literária. E porque os livros evocam bandas sonoras e as bandas sonoras evocam livros.Quais são os principais destaques da programação?A ligação entre a literatura e a música manifestada, entre outros modos, através de concertos únicos e uma feira do disco. Mas há mais. Chegam-me vários exemplos.Uma excelente peça dos Cães do Mar construída a partir do livro “Amores da Cadela Pura”, de Margarida Victória, Marquesa de Jácome Correia.Uma sessão com Richard Zenith, autor de “Pessoa: Uma Biografia”, que virá fazer uma residência literária para saber mais da passagem do autor pela ilha Terceira. Conversas diferentes. Alguns exemplos.A que irá acontecer com Isabela Figueiredo, autora que no livro “Caderno de Memórias Coloniais” trata, com um olhar seu, das relações de violência entre colonos e colonizados, desfazendo o mito português dos brandos costumes.A conversa com José Carlos Barros, que conhecíamos como poeta e passámos a conhecer como romancista. Um romancista – soubemo-lo depois – premiado (recebeu o Prémio Leya em 2021).A conversa com Nuno Artur Silva, uma das figuras que marcam o audiovisual português nas últimas décadas, como autor, director criativo de vários programas e fundador das Produções Fictícias. E a que se irá realizar com André Tecedeiro, Maria Brandão e David Soares sobre a importância do lugar na literatura.Desde a primeira edição que temos vindo a celebrar os autores açorianos que o merecem.Vasco Pereira da Costa é, claramente, um deles.E agora há um pretexto. Cumpre 50 anos de vida literária e publicou um novo livro de poemas, “Os Nós do Tempo”.Há sempre a preocupação de trazer nomes sonantes do panorama nacional e internacional, mas também de manter bem presente a literatura e os escritores açorianos?É nesse equilíbrio que nos temos situado desde o início. O chão literário açoriano é fundamental. Se não formos nós a cuidar dele ninguém o irá fazer por nós.O Arquipélago tem sido uma mostra de vários conteúdos, muito chegam pela primeira vez à região através deste evento. A adesão do público tem feito jus a este projeto?Já tivemos períodos de grande adesão, com salas cheias e muito entusiasmo. Já tivemos períodos de menor adesão sobretudo porque o vírus e o medo do vírus determinaram, como sabemos, comportamentos restritivos.Depois da tese e da antítese vem, como diz o filósofo, a síntese.O Arquipélago de Escritores aproxima-se da sua 5ª edição, quais têm sido as maiores dificuldades de organizar um evento desta dimensão nos Açores?A dificuldade começa por ser orçamental. E, por consequência, pelo facto de sermos muito poucos a querer fazer muito - muito para a dimensão.Mas não me quero ficar pelo orçamento e pelo investimento. É um problema que temos de resolver e que vamos resolver.Também nos preocupa a questão de fazer crescer os públicos.Este ano abrimos um trilho novo com eventos como uma conversa sobre a recente vaga de fanzines e um desafio escolar baseado num fenómeno que tenho acompanhado: o tik-tok literário.Há cada vez mais adolescentes a chegar a novos livros por causa das recomendações feitas nessa plataforma.Como gostaria de ver o Arquipélago de Escritores daqui a 10 anos?Gostaria que, daqui a dez anos, houvesse eventos do Arquipélago de Escritores em todas as ilhas.Temos de crescer como capacidade e como equipa, num equilíbrio entre o investimento público e o risco privado.Sou pelo “a pouco e pouco”. O que vejo é que, a pouco e pouco, os autores, sobretudo os açorianos, estão a ser mais valorizados cá. Com o esforço de muitos agentes. De professores, críticos e organizadores de iniciativas culturais a editores e livreiros. Veja-se o que tem acontecido este ano com Pedro da Silveira.A nossa maior virtude, em particular, revela-se pela boa inquietude que o Arquipélago de Escritores gera umas semanas antes do começo.Há muita gente a querer conhecer a programação.Se isso acontece é porque o nosso impacto é evidente.