Adaptação e ansiedade com os exames são principais queixas dos estudantes aos psicólogos
1 de dez. de 2024, 10:00
— Lusa
A medida foi lançada no final de setembro e menos de um mês depois já tinham sido pedidos 3.690 cheques e atribuídos 2.355.Entre
aqueles que já tiveram a primeira consulta, as experiências são
diversas, mas a maioria parece partilhar dificuldades relacionadas com a
nova realidade que está a viver no ensino superior.Quem
o diz é, por exemplo, Diogo Lima, um dos psicólogos inscritos na bolsa
de profissionais constituída pela Ordem dos Psicólogos e que, desde a
entrada em vigor da medida, já está a acompanhar três estudantes.“Dois
deles sofrem com uma das problemáticas que eu já antevia e que está
relacionada com a ansiedade nos momentos de avaliação”, explicou à Lusa,
referindo que muitas vezes a pressão, imposta até pelos próprios,
motiva picos de ansiedade.O mesmo motivo
levou também uma das pacientes de Rosana Milhomens a recorrer ao
cheque-psicólogo, e a psicóloga relata que outro dos estudantes que está
a acompanhar procurou ajuda para lidar com as dificuldades de
relacionamento interpessoal.Para muitos
estudantes, ingressar no ensino superior implica a adaptação a um
ambiente totalmente novo: nova escola, novos professores, novos colegas
e, muitas vezes, numa cidade diferente, sem a família e amigos.Essa
adaptação pode ser um desafio difícil, refere Diogo Lima, que explica
que “tudo o que é uma novidade também acaba por trazer momentos de
ansiedade”.No âmbito da medida, anunciada
pelo Governo ainda no verão, o estudante tem acesso a duas consultas
iniciais de diagnóstico e, se cumprir os critérios, recebe depois os
restantes 10 cheques.Mas há situações que
ficam de fora. Por exemplo, os alunos com necessidades educativas
específicas, que apresentem comportamentos aditivos, com diagnóstico de
perturbação psicótica ou bipolar, ou de perturbação da personalidade,
pensamentos suicidas e sintomas com duração superior a um ano e meio.Os
critérios de exclusão já tinham sido criticados pela Rede de Serviços
de Apoio Psicológico no Ensino Superior, mas também os psicólogos
ouvidos pela Lusa que integram a bolsa constituída pela Ordem temem que,
se seguirem as regras “à risca”, a maioria dos alunos poderá ficar de
fora.“Uma das alunas que estou a atender
já tinha ansiedade antes e piorou agora, mas eu não vou deixar de a
atender”, disse Rosana Milhomens, que acrescenta, por outro lado, que “a
primeira queixa nem sempre é o que aparece depois ao longo das
consultas”.Ana Carvalhal de Melo já
recebeu vários pedidos, mas ainda não iniciou as consultas. Ainda assim,
conhece bem as dificuldades dos estudantes depois de ter trabalhado nos
serviços da Universidade de Coimbra e concorda que os critérios são
demasiado restritivos.“É uma medida
paliativa no sentido em que estamos a trabalhar um bocadinho já sobre os
problemas que se instalam, mas aqueles que trazem mais disfunção e
fazem com que, no futuro, possa ter problemas acabam por ser excluídos”,
lamenta.Apesar das limitações, os três
consideram tratar-se de uma boa medida, mas reconhecem também que alguns
casos poderão deixá-los com o dilema de aceitar ou não os estudantes.“Eu
posso estar contra os requisitos, e estou, mas são claros e quer o
profissional quer o jovem que procura ajuda sabem quais são”, diz, por
um lado, Diogo Lima.Já Ana Carvalhal de
Melo sente a responsabilidade de acompanhar o estudante enquanto não
tiver outra resposta assegurada. “Não sei se isso faria de mim uma
prevaricadora”, questiona.Da parte da
Ordem dos Psicólogos, a resposta é que a medida nunca poderia propor-se a
responder a qualquer situação, porque existem limitações à partida.“Há
situações urgentes ou cuja complexidade ou gravidade exigem um trabalho
ao nível de equipas multidisciplinares”, explicou o bastonário,
Francisco Miranda Rodrigues, sublinhando que para esses casos existem
outras respostas.Por outro lado, o
bastonário refere que foi uma exigência da Ordem que o cheque-psicólogo
funcionasse como uma medida complementar e transitória, sem pôr em causa
o investimento e o reforço de outras, como o programa para a promoção
da saúde mental no ensino superior, lançado pelo anterior executivo.“O
melhor dos investimentos é, claramente, na prevenção e na promoção da
saúde. Isso não se faz em intervenções clínicas individuais”, defendeu.