Açores sofreram há 497 anos o sismo “mais destruidor” na história do arquipélago
22 de out. de 2019, 15:35
— Lusa/AO Online
Na
madrugada de 22 de outubro de 1522, Vila Franca do Campo foi atingida
por um forte sismo que destruiu quase por completo aquela que era na
época a capital da ilha de São Miguel."A
grande destruição de Vila Franca do Campo, não podemos saber se foi
causada mais pelo sismo ou pela escoada de detritos, foi um evento
combinado e conjugado entre um sismo que fica na história por ser o
sismo mais destruidor de que há registo nos Açores e por ter
desencadeado uma escoada de detritos com uma dimensão que não há igual",
disse à agência Lusa Rui Marques, presidente e investigador do Centro
de Informação e Vigilância Sismovulcânica dos Açores (CIVISA).O
investigador destacou ainda que "poucas casas ficaram levantadas" e que
"cerca de cinco mil pessoas foram mortas", apesar de este número poder
incluir algumas vítimas da peste negra que assolou a cidade após a
catástrofe.A destruição de Vila Franca, em
termos de catástrofes naturais, é apenas superada a nível nacional pelo
terramoto que assolou Lisboa em 1755, segundo o investigador.O
sismo sentido em São Miguel em 1522 foi de magnitude X na escala
macrossísmica europeia (que vai de I a XII, aumentado conforme o grau de
destruição) e a escoada de detritos ocorrida em Vila Franca ocupou
quatro quilómetros e meio de área, tendo um "impacto brutal" naquela que
era a capital de São Miguel de então."O
impacto foi brutal. Quando lemos os documentos, Vila Franca era o
principal porto de trocas comerciais dos Açores e, como tal, era
revestido de uma importância enorme. É uma vila que fica totalmente
destruída. Há relatos que falam de 70 a 100 pessoas que sobrevivem na
vila. Estamos a falar de uma mortalidade nunca vista nos Açores, sem
igual", apontou.A reconstrução de Vila
Franca não se deu no imediato, devido ao "medo" sentido pela população,
que motivou o aparecimento de tradições religiosas que permaneceram até
hoje, como as festas do Senhor Santo Cristo dos Milagres."As
pessoas ficam com medo de viver em Vila Franca e não a reconstroem.
Aquilo deve ter ficado um pandemónio, tudo soterrado em lama (…) foi
preciso o rei D. João III conceder grandes vantagens para as pessoas
irem para a vila", explicou Rui Marques, destacando que a "tradição dos
romeiros nasce devido à subversão de Vila Franca". Apesar
de este ter sido um episódio "único" desde o povoamento dos Açores,
existem registos geológicos de fenómenos de dimensões semelhantes
ocorridos no arquipélago "há milhares de anos" devido às características
vulcânicas do arquipélago, afirmou."Taludes
muito inclinados e depósitos geológicos muito friáveis (muito soltos),
simultaneamente com uma precipitação intensa no Inverno em quase todas
as ilhas, e ainda com sismos de vez em quando com magnitudes mais
elevadas, é um barril de pólvora. É a combinação perfeita para a
desgraça e temos todas as condições para que haja instabilidade em todas
as ilhas de forma transversal", alertou o investigador.Rui
Marques disse ainda que os "movimentos de vertentes (derrocadas) e
cheias são os dois perigos mais recorrentes e mais fáceis de prever".O
investigador assinalou ainda que "o que se sabe e se faz hoje em dia
está a anos luz do que se fazia nos Açores há dez anos, na área da
sismologia, vulcanologia, previsão de movimentos de vertentes e cheias".