O aspeto, o cheiro, o toque e a cor são
suficientes para entender a singularidade de uma meloa de Santa
Maria, mesmo antes de chegarmos ao sentido que nela tem mais
importância: o paladar. Hoje encontramo-la em grandes superfícies,
ao lado de tantas outras frutas mas, há relativamente poucos anos,
seria bem mais difícil encontrá-la longe da sua ilha já que, no
início do milénio, a sua produção era pequena e muito limitada.
“Os poucos produtores que existiam
faziam concorrência uns com os outros, os preços eram baixos e
havia até muita meloa que ficava na terra”, explica o engenheiro
Duarte Moreira, atual presidente do Conselho de Administração da
Agromariensecoop. Nessa altura, enquanto chefe de divisão do Serviço
de Desenvolvimento Agrário de Santa Maria, já olhava a atividade
com preocupação, partilhada tanto por produtores como pelo próprio
Governo Regional. Foi ela um dos motivos para a elaboração de um
estudo para avaliar as condições produtivas da ilha. A principal
conclusão foi o reconhecimento da necessidade de criar uma estrutura
que representasse todos os produtores, prestasse apoio técnico e
valorizasse o produto no mercado. Assim nasceu a AgroMarienseCoop, em
janeiro de 2006, para definir estratégias conjuntas que
beneficiassem todos “a uma só voz”, como descreve Duarte.
Uma das principais conquistas que
destaca, ao longo destes 18 anos, é a certificação da Meloa de
Santa Maria como produto IGP (Indicação de Origem Protegida). Foi
precisa uma década para concluir o processo, mas a sua importância
cedo tornou-se evidente, explica o presidente. “A partir da
certificação abriram-se outros mercados, nomeadamente o
continental. A produção aumentou, criaram-se critérios de
qualidade, contrataram-se técnicos, o sector profissionalizou-se e a
meloa chegou onde está hoje”.
Esses critérios fazem com que hoje
todo o processo seja mais exigente e rigoroso. “Há um grande
controlo do ponto de vista da qualidade nutritiva e dos agroquímicos,
de forma a que a meloa se mantenha um produto da mais alta
qualidade”, assegura. Manter estes altos níveis de controlo pode
revelar-se um desafio, a par dos outros inerentes à produção e que
persistem ao longo do tempo, desde a imprevisibilidade do clima à
escassez de mão de obra, dada a sazonalidade da atividade. Mas para
Duarte Moreira, o maior obstáculo atualmente está relacionado com
os transportes.
“Sabemos que é um problema
transversal a todas as ilhas, mas sobretudo das mais periféricas,
como é o nosso caso. Dificulta muito a colocação da meloa com
rapidez no mercado, de forma a chegar ao consumidor no menor tempo
possível desde a sua apanha. Tem sido uma luta constante”,
confessa, acrescentado os custos elevados à equação. Olha, ainda
assim, com esperança para o futuro e reconhece alguns avanços
positivos, nomeadamente através da recente melhoria nas condições
dos transportes marítimos para Portugal continental e do recurso ao
transporte aéreo para fazer chegar a meloa, por exemplo, às ilhas
do grupo central e ocidental. “Claro que não se faz planos
estratégicos sem que haja desvios, atrasos e imprevistos”, garante
o engenheiro.
Nem sempre essas mudanças de planos
são negativas, e a recente aposta na vitivinicultura é prova disso.
Quando, há cerca de oito anos, surgiu em Vila do Porto um projeto
para a valorização da paisagem protegida da vinha na ilha de Santa
Maria, a cooperativa foi convidada a fazer parte e ajudar numa
primeira experiência.
“O objetivo era ter, pelo menos, um
vinho em condições de ser certificado como IGA (Indicação
Geográfica Açores) até ao final do ano passado. Felizmente,
conseguimos certificar três e este ano já instalamos uma verdadeira
adega, de forma a tornar todo o processo mais comercial”, revela
Duarte Moreira. Acrescenta que há margem para crescer ainda em
outros sectores, como o da carne, estando a decorrer um processo de
candidatura, através do PRR, para a remodelação da sala de
desmancha da cooperativa.
“Somos polivalentes, que é o que faz
mais sentido numa ilha pequena como a nossa”, defende, sem deixar
de acrescentar que, apesar disso, a protagonista mantém-se a mesma,
passadas quase duas décadas. “A meloa foi o produto âncora e
continua a ser o que mais nome nos dá, porque chega aos quatro
cantos do território nacional. É um produto de alta qualidade, é
reconhecido”, sublinha.
Hoje, a meloa de Santa Maria faz par
com muitos produtos, como gelados e iogurtes e, nas instalações da
cooperativa, as meloas que não chegam às prateleiras dão origem a
doces e compotas sob a marca mariense, nascida em 2015.
Segundo Duarte Moreira, não há mãos
a medir para a procura que é atualmente sentida. “Não temos meloa
suficiente para dar resposta às grandes superfícies a nível
nacional. Os nossos critérios de qualidade apertados fazem com que
nem toda a meloa produzida seja colocada no mercado, mas isso é que
lhe dá mais valor. O consumidor já sabe que, ao comprar uma meloa
de Santa Maria, é garantido que ela é boa”.
A sazonalidade não é problema,
explica, e torna até o produto mais especial. “Quer os
consumidores, quer os nossos parceiros de distribuição sabem que,
tal como certos chocolates são do Natal, a meloa de Santa Maria é
do verão”, assegura, até porque a importância da sua produção
para a valorização da ilha, das suas gentes e da sua singularidade
é algo sem época e que se sente o ano inteiro.