Autor: Rui Jorge Cabral
Quando foi fundada a Sociedade Filarmónica Triunfo e o
que fez com que esta banda filarmónica da Ribeira Grande sobrevivesse
para se tornar a mais antiga dos Açores?
A sociedade Filarmónica Triunfo foi fundada a 2 de Fevereiro de 1846, no coração da Ribeira Grande, e é com muito orgulho que hoje podemos dizer que é a filarmónica mais antiga dos Açores. O que fez com que resistisse ao tempo foi, sem dúvida, o espírito de entrega e de comunidade, que sempre a acompanhou. Foram muitas gerações que cresceram aqui, partilhando o gosto pela música e a vontade de manter viva uma tradição que é de todos.
O segredo da sua sobrevivência está na paixão dos seus músicos, na entrega dos seus dirigentes e no apoio da população da Ribeira Grande que vê nesta instituição um verdadeiro símbolo do seu património — apoio esse que se estende também aos sócios e amigos emigrantes que, mesmo longe, continuam a acompanhar, valorizar e contribuir para que a Triunfo permaneça viva.
O que significa para si assumir a presidência da Sociedade Filarmónica Triunfo com apenas 23 anos?
Assumir a presidência da Filarmónica Triunfo aos 23 anos é, para mim, uma honra e um desafio enorme. Faço parte desta filarmónica desde 6 de novembro de 2012, precisamente no ano em que reabriram esta instituição, e foi aqui que construí a minha história com a música e com esta comunidade.
Hoje, liderar esta instituição com quase dois séculos de existência é uma forma de retribuir tudo o que aprendi, trazendo uma energia jovem e novas ideias, mas sempre com respeito pelo legado de quem construiu a Triunfo ao longo das gerações.
Como surgiu em si o gosto pela música e o interesse pelas bandas filarmónicas?
O meu gosto pela música e o interesse pelas bandas filarmónicas nasceram de uma ligação familiar muito especial. Quem me inscreveu na Sociedade Filarmónica Triunfo foi o meu avô materno, já falecido, que também tinha sido músico nesta mesma banda. Crescer sabendo da sua história e sentir a sua paixão pela música despertou em mim o desejo de seguir os seus passos. Desde então, a filarmónica tornou-se não só um lugar onde aprendi música, mas também um espaço onde a memória do meu avô e o legado de tantas gerações continuam vivos, inspirando-me todos os dias para dar o meu melhor e honrar a história da Triunfo.
Quais são os seus principais objetivos enquanto presidente da Sociedade Filarmónica Triunfo? Quantos músicos tem atualmente a banda?
Como presidente da Filarmónica Triunfo o meu principal objetivo é reforçar e valorizar o papel da filarmónica na nossa comunidade. Pretendo apostar na formação musical dos nossos jovens, incentivar a entrada de novos elementos, e ao mesmo tempo, motivar aqueles que já passaram pela nossa instituição a regressar.
O apoio e a colaboração de antigos músicos são fundamentais para o fortalecimento e a continuidade da nossa banda. Queremos garantir que a tradição filarmónica se mantenha viva e dinâmica, aumentando a visibilidade da Sociedade através de concertos, eventos e parcerias que evidenciem o valor cultural e social da nossa música. Atualmente, a banda conta com um número reduzido de músicos, o que reflete os desafios enfrentados por muitas filarmónicas.
No entanto, temos um grupo muito dedicado, empenhado e com grande espírito de união. Acreditamos que, com o apoio de todos - antigos e novos membros - conseguiremos dar nova força e vitalidade à Sociedade Filarmónica Triunfo, preservando o seu legado e preparando o futuro com entusiasmo.
As bandas filarmónicas estão em risco nos Açores? Quais são as maiores dificuldades que as bandas enfrentam atualmente?
Sim, infelizmente as bandas filarmónicas estão a atravessar uma fase difícil nos Açores. Tornou-se cada vez mais complicado encontrar pessoas que queiram dedicar o seu tempo e talento a uma banda apenas por gosto e paixão pela música.
Hoje
em dia, há uma grande falta de músicos, e muitas bandas veem-se
obrigadas a recorrer a músicos externos remunerados para conseguirem
manter a sua atividade.
Esta situação fragiliza o espírito
tradicional das filarmónicas, que sempre se baseou no voluntariado, na
entreajuda e no amor à instituição.
Apesar disso, acredito que ainda é possível inverter esta tendência, apostando na formação de jovens, na valorização dos músicos e no reforço do sentimento de pertença que sempre caracterizou as nossas bandas.
O que pode ser feito para atrair novamente a juventude para as filarmónicas?
Hoje em dia, muitos jovens têm a ideia de que fazer parte de uma filarmónica é algo “chato”, especialmente por estar associada às procissões e a atos religiosos. Infelizmente, é cada vez mais raro ver jovens interessados nesse tipo de participação.
No entanto, o que muitos não percebem é que esses momentos são precisamente as oportunidades em que a banda sai à rua e mostra o trabalho que é feito com tanto empenho dentro das salas de ensaio.
O que podemos fazer para atrair os
jovens é mostrar o que realmente é estar numa filarmónica: mais do que
tocar música, é conviver, criar amizades e partilhar momentos únicos.
Devemos
também refletir: o que seria de uma procissão sem uma banda
filarmónica? A presença da banda dá vida, emoção e identidade às nossas
tradições.
Depois dos ensaios, há sempre tempo para estarmos juntos, conversar e fortalecer o espírito de grupo — algo que torna esta experiência ainda mais especial. Fazer parte de uma banda é pertencer a uma verdadeira família musical que mantém viva uma das tradições mais bonitas da nossa cultura.
A Filarmónica da Matriz sempre foi o som do
nosso coração — acompanhou-nos em festas, procissões e momentos que
guardamos com carinho. Hoje, precisa de nós.
Faltam músicos, mas há
muito amor pela música e pela nossa terra. A todos os que já fizeram
parte desta família, deixamos o convite: voltem a pegar no instrumento e
juntem-se novamente a nós. Vamos juntos devolver força e vida à nossa
Filarmónica!
As bandas filarmónicas devem evoluir o seu reportório no sentido de o tornar mais moderno e atraente para um público mais vasto?
Sim,
penso que as bandas devem procurar atualizar o seu repertório,
tornando-o mais moderno e apelativo para um público mais amplo, sem
perder a sua essência e identidade.
Incluir peças contemporâneas ou
estilos diferentes pode tornar os concertos mais dinâmicos e atrair
novas audiências, incluindo jovens músicos. Ao mesmo tempo, é
essencial manter a ligação à tradição, garantindo que a história e o
património musical da banda continuam presentes. Assim, conseguimos equilibrar inovação e legado, tornando a banda relevante hoje e no futuro.
Que desafios se colocam hoje à formação de novos músicos para as bandas filarmónicas?
Atualmente, a formação de novos músicos para as bandas filarmónicas enfrenta vários desafios. Um
dos principais é captar o interesse dos jovens, que muitas vezes não
conhecem a riqueza e a experiência de tocar numa banda, tanto a nível
musical como social. Outro desafio importante é a falta de recursos, especialmente financeiros.
O
ideal seria que cada banda pudesse oferecer um professor para cada
instrumento, de forma a complementar bem a formação e permitir que todos
os jovens evoluam com qualidade. Investir na formação e mostrar o lado divertido e coletivo da banda é essencial para garantir a continuidade desta tradição.