Açoriano Oriental
Não há cenário otimista sobre como deter o Estado Islâmico
O investigador norte-americano J.M. Berger defendeu, em entrevista à Lusa, que "não há um cenário muito otimista" sobre como impedir o grupo extremista Estado Islâmico de se expandir, cortar-lhe o financiamento e deter o recrutamento de combatentes estrangeiros.
Não há cenário otimista sobre como deter o Estado Islâmico

Autor: Lusa / AO online

 

“É um problema muito difícil. Quanto ao financiamento – vou começar por aí, porque é o aspeto de mais fácil solução -, anteriores organizações terroristas com o modelo da Al-Qaida obtinham financiamento de doadores estrangeiros e, por isso, havia coisas que podíamos fazer através do sistema bancário, cooperando com os outros países para tentar cortar fundos que recebiam de gente rica do Golfo Pérsico que partilhava os seus pontos de vista”, explicou.

“Mas o Estado Islâmico é um animal de uma espécie diferente neste aspeto: obtém os seus fundos sobretudo internamente e, quando avança sobre um território, extorque todos os recursos que consegue, cobra impostos às pessoas que lá vivem, apodera-se de todas as infraestruturas de que possa extrair dinheiro, como refinarias de petróleo, que depois vende no mercado negro, todo o equipamento militar que consiga obter e todos os bens líquidos – dinheiro, essencialmente – em que possa meter a mão. E isso é muito mais difícil de impedir”, sustentou.

Para Berger, coautor do livro “Estado Islâmico: Estado de Terror”, com Jessica Stern, e que estuda grupos extremistas há cerca de dez anos, “se se conseguir impedir o EI de se expandir, pode-se começar a cortar-lhe as formas de financiamento porque é muito dispendioso gerir um proto-Estado como aquele que o grupo está a construir”.

“Se conseguirmos impedi-lo de estender a sua influência durante um longo período de tempo, as suas finanças entrarão em colapso – mas pode demorar algum tempo até isso acontecer”, advertiu.

Quanto à circulação de combatentes estrangeiros, o estudioso do extremismo reconheceu que o seu controlo “tem apresentado muitas dificuldades, já que há combatentes vindos de todo o lado e que cada país tem níveis de controlo diferentes sobre como as pessoas podem sair, cada país tem diferentes níveis de vigilância de pessoas que possam juntar-se ao Estado Islâmico”.

“Alguns países são bastante bem-sucedidos em deter essas pessoas antes de elas saírem, outros nem tanto”, observou.

Em última análise, apontou, “o grande problema é que a fronteira entre a Turquia e a Síria não é segura e, por isso, é muito fácil, para quem quiser, atravessá-la”.

“Se o Governo turco tiver a vontade e a competência para resolver esse problema, não conseguiremos deter totalmente o fluxo de combatentes estrangeiros, mas poderemos reduzi-lo de forma bastante significativa”, sublinhou.

J.M. Berger considera que a expansão do EI deve ser impedida por meio de uma operação militar, sim, mas regional.

“Acho que as potências regionais, os países vizinhos, têm de combater estes tipos militarmente; não tenho a certeza de que os países ocidentais devam participar, por duas razões: em primeiro lugar, enquanto cidadão norte-americano, acho que encorajámos as pessoas a pensarem que tudo o que acontece no Médio Oriente tem que ver connosco [EUA]; por isso, de cada vez que alguma coisa corre mal, basicamente, a culpa é nossa - e a culpa é nossa quer tenhamos feito alguma coisa ou não. Acho que precisamos de destruir essa perceção”, defendeu.

Em segundo lugar, se o Ocidente não intervier, “isso significa encorajar as potências regionais a assumir a responsabilidade de resolver o problema que têm no seu quintal das traseiras”, vincou.

Segundo o investigador, embora o Ocidente esteja, neste momento, a realizar ataques aéreos e a fornecer algum apoio, “a forma como está a fazê-lo podia ser melhor”.

“Estamos a fazer aquilo a que os militares chamam ofensiva de ‘baixa intensidade e longa duração’, ou seja, bombardeamentos muito cirúrgicos e, aparentemente, preparamo-nos para os fazer durante um longo período de tempo, o que não é uma boa estratégia para combater o EI, que se move muito rapidamente e tem muitos recursos”, frisou.

“Preferia – prosseguiu - que atacássemos mesmo infraestruturas dentro do território que o EI controla, para atingir as estradas, a rede elétrica, as antenas das redes móveis, as refinarias de petróleo, porque isso aumentaria as pressões internas”.

A ideia que subjaz a esta forma de atuação da coligação é “a de querer preservar esses bens para quando o Governo iraquiano regressar àquele território”, referiu, logo acrescentando que a questão que se coloca é: “Será que o Governo iraquiano regressará àquele território em breve?”.

“Parece-me que a resposta é ‘não’, a não ser que destruamos essas infraestruturas”, rematou.

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