Autor: Lusa/AO Online
A análise consta do relatório anual do Observatório de Políticas de Educação e Formação (OP.EDU), coordenado pela ex-secretária de Estado do Governo socialista de António Guterres, Ana Benavente, que é hoje apresentado nas instalações do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, em Lisboa.
“Sendo o primeiro ano do atual Governo - ano de transição - o OP.EDU considera positivas as medidas até agora adotadas, assinalando o momento de abertura sociopolítica, apesar dos constrangimentos nacionais e europeus. No entanto, as políticas estruturais ficam aquém das necessidades vividas nas instituições, com muitos “efeitos de anúncio” e fracas intervenções para a resolução dos problemas herdados”, conclui-se no estudo.
O relatório, que se centra no primeiro ano do atual Governo, referido como ano de transição, e que o caracteriza, de forma genérica, como positivo, não deixa de apontar semelhanças “muito preocupantes” entre os programas de governação do executivo PSD-CDS-PP que liderou Portugal nos anos de intervenção da ‘troika’ e o do Governo de António Costa.
“Entrámos, com o atual Governo, numa nova fase de políticas educativas em que as orientações e as medidas anunciadas são positivas. No entanto, não emerge, neste ano de transição, um modelo de escola renovada, quer no programa de Governo, quer nos acordos parlamentares celebrados”, afirma-se no estudo, ainda que se reconheçam “diferenças notórias” nas propostas dos dois Governos “numa perspetiva político-ideológica da educação”.
Alerta-se ainda para o “caráter avulso” da legislação produzida, que não permitem ver uma orientação para a atual legislatura: “mês após mês, vão surgindo iniciativas dos órgãos de soberania, do Parlamento ao Ministério da Educação, sem que se clarifiquem orientações para além da urgência e de algumas iniciativas político-mediáticas sem continuidade”.
O estudo é muito crítico da governação do executivo PSD-CDS-PP, apontando medidas tomadas, “de caráter gravoso”, que traduzem, segundo os autores, uma perspetiva da educação enquanto um custo e não um investimento.
Entre os exemplos apontados constam o aumento de alunos por turma, aumento do horário de trabalho de professores e funcionários, criação de mega-agrupamentos escolares, menorização de algumas componentes do currículo, como a educação artística, e a introdução de exames nacionais em todos os ciclos de ensino, incluindo o 1.º ciclo, “com o retorno à seleção precoce dos alunos, numa lógica de seleção social e de degradação do estatuto e da importância da formação profissional”.
“Tudo isto aconteceu numa sociedade em que aumentaram as desigualdades e a pobreza, tocando os grupos mais vulneráveis, nomeadamente as crianças e os jovens, com impacto na vida escolar e educativa e com riscos acrescidos de exclusão social”, refere ainda o documento.
Os autores afirmam que o país “herdou em 2015” um modelo de escola ao qual se opõem, marcado “pelas consequências da política neoliberal, uma escola expositiva e seletiva, a da educação instrumental, com menosprezo pelas dimensões humanas, cívicas e democráticas da Educação”.
O OP.EDU pede uma escola que forme “pessoas e não números”, com “saberes e competências para agir em todos os domínios da vida individual e social, de modo crítico e responsável”, acrescentando ser “urgente ultrapassar uma instituição escolar instrumental, baseada na passividade e na obediência de pessoas que, educadas na competição e no individualismo, são vistas como meros ‘recursos humanos’”.