Açoriano Oriental
Encerramento da linha do Douro junto à fronteira acabou com identidade das populações
O encerramento da linha férrea do Douro junto à fronteira, nos anos 80, contribuiu para um despovoamento que vinha de trás e retirou a identidade às populações.

Autor: Lusa / AO online

Alfredo Poiarez, presidente da Junta de Freguesia de Escalhão (Figueira de Castelo Rodrigo), e da aldeia de Barca d’Alva, conta que “só quem lá esteve é que via o monte de gente ali empregada ”, entre “trabalhadores dos Caminhos de Ferro, despachantes, da Alfandega e da Guarda Fiscal”, diz, quem foi um deles e passou ali os últimos 7 anos.

“O comboio movia muitas pessoas, (..), muito material”, lembra Alfredo Poiarez, que viu entretanto a sua freguesia perder “cerca de mil habitantes” para os 1500 atuais, desde 1985, ano em que o último comboio partiu de Barca d’Alva.

A linha do Douro, idealizada e construída pela comunidade portuense, nos finais do século XIX, teve como principal objetivo ligar o Porto a Salamanca e fazer chegar mercadorias à Europa.

Horácio de Sousa, inspetor e fator chefe em Barca d’Alva, recorda os cerca de” 50 empregados efetivos que se foram embora juntamente com os seus familiares”, após o encerramento deste troço.

Hoje, em Barca d’Alva, “se não fossem os barcos – cruzeiros do Douro -, não se dava aqui nada”, diz, embora reconheça que “na aldeia deixam muito pouco rendimento”.

Luís Patrício, em tempos colega de profissão de Horácio, é da mesma opinião, e vai dizendo que os turistas dos barcos “chegam e partem logo nos autocarros para Salamanca”.

Desde 1981, os concelhos de Freixo de Espada à Cinta, Vila Nova de Foz Côa e Figueira de Castelo Rodrigo perderam cerca de 8 mil habitantes no seu conjunto, um terço da população, segundo estatísticas até 2009.

A população começou a diminuir a partir dos anos 50, ano em que chegaram a residir 39 mil pessoas nestes três concelhos, hoje, apenas 17 mil, em quase 1200 quilómetros quadrados de território.

No ano de 1986, também os espanhóis perderem a sua ligação até Barca de Alva, deixando para traz 19 pontes metálicas e 20 túneis, numa obra de engenharia do ferro única, construída essencialmente por portugueses, troço que foi declarado, nos anos 90, com Bem de Interesse Cultural pela autonomia de Castela e Leão.

A génese desta linha de ferro, liga-se assim, inevitavelmente, ao outro lado da fronteira, cuja situação em termos de despovoamento não foi diferente, revela o presidente da Câmara da vizinha “Freigeneda”, Bernardo Garcia, que fala em português.

“Se não foi a primeira causa de despovoação – o encerramento da linha – foi a segunda”, diz-nos este professor de línguas clássicas, depois de fechada a mina de estanho em 1979, ambas as causas que ajudaram à considerável perda de 50 por cento de população até hoje, refere este “Alcalde”.

“ O caminho-de-ferro foi sempre um dos grandes sinais da identidade desta população, afastada num só momento”, lamenta Bernardo Garcia, que considera a abertura da linha “um dos fatores possíveis para conter a desertificação”.

Também José Bautista, presidente da Câmara vizinha de “Hinojosa de Douro”, fala nas mesmas perdas, e numa região “que tradicionalmente nunca teve futuro, mas que agora sim, pode ter presente”, com a reabertura da linha para fins turísticos e culturais, acredita.

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