Autor: Cristina Pires/ Ana Paula Fonseca
Porque aceitou este desafio?
Aceitei este desafio porque acho que é
importante que haja participação cívica das pessoas. Já tive
participações em outras listas, em outros momentos da nossa sociedade, e
senti que agora era chegado o momento. Senti esta necessidade interior e
percebi também que havia muito apoio por parte dos lagoenses (...).
Participou em algumas listas candidatas ao Poder Local. Considera que tem muita ou pouca experiência política?
Sou
um homem modesto. Aprecio mais a modéstia do que propriamente alguns
exibicionismos. Neste caso, não posso ser tão modesto. Hoje não tenho
qualquer problema em enfrentar este desafio autárquico, porque estou
completamente ciente de que sou capaz de estar de acordo com aquilo que
são as necessidades e as exigências que um cargo destes acarretam.
Se
for eleito uma das suas primeiras iniciativas será no sentido de
elaborar o novo Regulamento de Taxas e Tarifas para os Serviços de Água,
Saneamento e Resíduos. Esta é uma prioridade porquê?
Esta é uma
prioridade para se fazer justiça. Eu não me conformo que no concelho da
Lagoa que este tipo de serviços seja o mais caro da ilha de São Miguel.
Isto são serviços básicos que são prestados à população. A própria
entidade reguladora ERSAR admite, como possível, que este serviço seja
parcialmente subsidiado pela dotação camarária. Se assim é, desde logo,
há que perceber a estrutura de custos afetos a tipo de serviços e se
necessário for, por uma questão de justiça social para os lagoenses,
deve ser resolvido este regulamento no sentido de criar alguma equidade
relativamente aos habitantes de outros concelhos.
Na sua opinião, porque é que a água é mais cara na Lagoa?
Não
vejo justificação para isso. A Lagoa é um concelho geograficamente
pequeno. Os padrões de qualidade exigidos a estes serviços não são
justificação para que na Lagoa o serviço seja mais caro. No meu
entender, é um gesto de pouca vontade por quem tem gerido o concelho e
que, de alguma forma mais ou menos discreta, tem tirado algum dinheiro
aos bolsos dos lagoenses.
Que outros problemas existem atualmente no concelho?
(...)
Há casos de sobrelotação no concelho e de novas famílias que não têm
condições financeiras para terem um lar seu, nem que seja por um regime
de arrendamento. É nossa intenção desenvolver esforços, para que se
possa resolver de forma concreta o problema destas famílias. A habitação
social é uma prioridade no meu mandato. Lido com pessoas todos os dias
e, de uma forma informal, tenho-me apercebido das debilidades que
existem a nível da habitação.
(...) É a falta de emprego de forma
consistente. Vão-se arranjando algumas soluções de empregabilidade
temporária, mas esta dura o que dura e não permite às famílias terem
objetivos de futuro. Quando uma família está exposta a processos de
emprego temporários não consegue projetar o futuro porque as limitações
são já no dia a seguir.
A criação de emprego não é uma competência direta das autarquias. O que pretende fazer para minimizar esta realidade?
(...)Vejo
com alguma tristeza, por exemplo, que parques industriais e comerciais
existentes no concelho de Ponta Delgada têm dinâmicas muito
interessantes e incomparavelmente melhor do que aquilo que acontece nos
dois parques industriais da Lagoa. Deixou de ser interessante investir
na Lagoa. É preciso perceber porque é que isso acontece (...). Estamos
no centro de quatro dos sete concelhos mais importantes dos Açores e
isso, por si só, quer ao nível de logística e de todas as outras
atividades seria muito favorável aos investidores investirem na Lagoa.
Se forem criadas condições para que se instalem outras empresas no
concelho, serão estas empresas a criar postos de trabalho (...).
É uma critica à criação do Tecnoparque e à aposta do atual executivo camarário de apostar na Ciência e Tecnologia?
Não
sou critico relativamente ao Tecnoparque, nem ao Parque de Ciência e
Tecnologia. Acho é que não se podem misturar as coisas. A criação do
Parque de Ciência e Tecnologia deveu-se a inúmeros fatores, desde logo, a
algum bom relacionamento que existia dos então presidentes de câmara da
Lagoa com o Governo Regional.
Relativamente ao Tecnoparque, em 2009,
o Engenheiro João Ponte prometeu que ia levar por diante a construção
do Tecnoparque e fê-lo. Só que, as coisas têm de passar um pouco para
além das obras. No nosso país, existiu durante muitos anos o culto da
obra. Faz-se a obra, corta-se a fita e inaugura-se... o Tecnoparque não
foi exceção a isso. Tirando a parte da Ciência e Tecnologia, há
promessas de investimentos de grande dimensão, mas ficamos por enquanto
pelas promessas. Não nos podemos esquecer que o Tecnoparque já tem seis
anos. E seis anos dá tempo de nascer o menino e levá-lo à escola. O
menino ainda nem anda pelo seu pé.
O que é que a câmara pode fazer para captar estes investidores?
Existe
um pequeno troço de ligação entre o parque industrial do Chã de Rego
d’Água e a via de ligação entre a Lagoa e Ribeira Grande que,
estranhamente, já está há uns anos à espera de ser pavimentado. Só
recentemente chegou-se à conclusão que havia necessidade de o
repavimentar. Há razões políticas que me levem a acreditar que há
motivos estranhos para pavimentação daquele piso quando devia ter sido
uma situação já há muito tempo realizada, até porque aquele troço é
parte também da ligação entre os dois parques industriais do concelho.
Como
as coisas não se resolvem só com obras e estradas, há que criar
dinâmicas e, desde logo, parcerias que poderiam ter um envolvimento mais
direto com as empresas no sentido de por exemplo, baixar as taxas de
licenciamento para a construção de edifícios nestes parques, uma exceção
de forma temporária, com a redução de IMI, no sentido de criar pelo
menos a entrada de empresas no concelho. Se estivermos a falar de um
período excecional e transitório de cinco anos, já dá uma almofada de
conforto às empresas (…).
Um dos projetos que aponta para a Lagoa é via atlântica. Em que consiste esta obra?
Não defendo obras megalómanas. As coisas devem começar precisamente ao
contrário. A gestão dos recursos públicos deve ser feita na exata medida
e proporção aquilo que é o perfil que cada político que tem
responsabilidade de levar por diante os destinos do concelho ou daquilo
que está a gerir. O que defendo para a via atlântica são intervenções
mínimas porque desde logo, em algumas zonas onde estas intervenções têm
de ser feitas e ao abrigo do que está mapeado no Plano de Ordenamento da
Orla Costeira de São Miguel, obriga que as intervenções sejam
minimalistas.
Seriam feitas onde?
Entre a zona do Cruzeiro e a
Baia de Santa Cruz. É muito importante que haja uma ligação de toda
aquela orla de costa. A zona do cruzeiro por si só não representa
mais-valia mas sim junta com a zona das piscinas, a praia de Santa Cruz.
Aqueles três quilómetros de costa devidamente valorizados podem ser uma
mais-valia para o concelho, porque o turista que nos visita não vem
para ver grandes obras de betão. Temos é que definir, assentar e
valorizar aquilo que é o perfil da nossa terra.
(...) Estou
consciente que tudo o que for feito no concelho da Lagoa não pode ser
pensado em ‘timings’ eleitoralistas. Não me incomoda a ideia de daqui a
quatro anos, ter um número considerável de obras não concluídas e de
não cortar fitas. O que está em causa é a concretização de obras
objetivas, e que se fazem valer do investimento que foi feito.
Até que ponto o concelho de Lagoa tem vindo a beneficiar do turismo em crescimento na ilha de São Miguel?
(...)
Não é difícil fazer as pessoas deslocarem-se 12 ou 13 quilómetros até à
Lagoa, mas não podem deslocar-se para verem nada. O concelho da Lagoa
já foi uma referência muito grande em termos de restauração, e que foi
perdendo esta projeção. (...) O emprego e as empresas não se criam por
decreto. Criam-se quando há condições para tal. Eu tenho ouvido com
algum desgosto, das conversas que tenho tido recentemente com algumas
pessoas amigas, que têm investimentos e dizem que ‘não vale a pena
investir na Lagoa’.
Quais são os argumentos que apresentam?
Os
argumentos que me apresentam é que é mais viável e economicamente mais
interessante investir em Ponta Delgada. O que não posso concordar. Hoje
os 10 quilómetros que separam Ponta Delgada da Lagoa não são obstáculo
para coisa nenhuma. O que falta, se calhar, é criar entusiasmo no
concelho. Desde logo, é possível construir mais na Lagoa que tem uma
capacidade construtiva muito interessante. Novos residentes é mais
economia, mais necessidade de restauração, de empresas de venda a
retalho. Ao criar na Lagoa outras dinâmicas de habitação, o concelho
terá mais população e fará funcionar parte da economia. (...)
Que balanço faz da governação socialista, em particular nos últimos quatro anos?
(...)
A governação socialista dos últimos anos não quer dizer que tenha sido
negativa no seu todo. Nos últimos quatro anos, o concelho parou. O
engenheiro João Ponte, com alguma sabedoria política, não desenvolveu
investimentos para os quatro anos porque, no meu entender, também ele
não quis começar projetos para depois haver outros a cortar as fitas.
Ele é hábil nestes gestos e o que resultou dai é que Cristina Calisto é
hoje uma presidente de câmara que não se fez notar em termos de
atividade no concelho.
Está confiante na sua eleição?
Parti
para este desafio sem objetivos de perder ou ganhar. A participação
cívica foi o que me motivou. Os lagoenses conhecem-me e eu conheço os
lagoenses e, a partir dai, a decisão está nas mãos deles. As eleições de
1 de outubro estão a ser encaradas com toda a tranquilidade. Antes de
ser político já era lagoense, e sempre tive profissão. Não estou atrás
de um cargo de projeção social e política.