Açoriano Oriental
E agora?
A presente crise financeira gera a oportunidade para uma melhor racionalidade
na afectação dos nossos recursos, o que exige a melhoria da qualidade
do investimento público e do investimento privado
E agora?

Autor: Carlos Decq Mota
“A primeira década do século XXI vai ser a pior para a economia portuguesa desde a Segunda Guerra Mundial. Em média, a julgar pelas últimas previsões, o crescimento anual deverá rondar os 0.6%. Desde os anos 60 que Portugal tem vindo a abrandar”
Isto dizia-se antes da palavra subprime ter chegado ao discurso do dia-a-dia. As dificuldades que o nosso País enfrenta desde 2001 devem-se a causas internas, fundamentalmente, como sejam um elevado endividamento a partir da segunda metade dos anos 90, agravado naturalmente por “fortes ventos que sopram do exterior”.
Mesmo que o fraco crescimento possa parecer um simples número, um dado estatístico, no fundo não deixa de ser um elemento com consequências sérias na vida das pessoas e das famílias.
As empresas dependem muito do consumo para gerarem lucros, mas são afectadas e obrigadas a reduzir a produção e mesmo, nos casos limites, a “DESPEDIR PESSOAL”.
Cria-se assim uma bola de neve que tem sérias consequências no número de desempregados.
Esta situação é muito grave, porque para além do consumo em Portugal ter abrandado, prejudicando as empresas que produzem bens e serviços, a concorrência internacional entrou-nos pela porta adentro a elevada velocidade, em sectores chaves da nossa economia.
Falo, claro, dos gigantes China e Índia, que usufruem da vantagem quase imbatível dos baixos salários e de moedas subvalorizadas.
Muitos são os especialistas na área económica, da gestão, da política, dos média, e outro tipo de treinadores de bancada (alguns que ainda num passado muito recente debitavam macroteorias mas com pontaria muito pouco afinada) que procuram encontrar as verdadeiras razões do sucedido e do que ainda vai suceder.
Foram tantos e com tanta profecia que se instalou pelo menos em três a quatro dias um verdadeiro pânico nos mercados, mas sobretudo nas pessoas, que desnorteadas viam o mundo desabar em cima de si, comprometendo toda uma vida de sacrifícios.
Foi de facto um momento terrível, com acusações aos reguladores por não terem regulado como deviam, aos Bancos por terem emprestado dinheiro a quem não deviam, com publicidade enganosa diariamente, etc.
Depois veio a confissão do “Crime “ por parte do “maestro”, aquele que dirigiu a Reserva Federal durante 18 anos, coincidindo com o maior período de expansão da economia americana no pós-guerra. Disse ele, ALAN GREENSPAN, “Cometi um erro ao confiar que o livre mercado pode regular-se a si próprio sem a supervisão da Administração”.
Cá dentro, em Portugal, o sistema financeiro aguentou-se, mas igualmente afectado, tendo como resultado que as contas dos grandes bancos privados caíram em média mais de 50% dos valores do período homólogo.
Mas com o dinheiro mais caro e com a falta de liquidez os bancos abrandam a concessão de crédito, aumentam as taxas de juro, dificultando assim a vida àqueles que do dinheiro necessitavam, sejam particulares ou empresas.
Mas é tempo de tranquilizar o mercado, de tranquilizar os empresários e as famílias.
Vem o aval do Estado aos bancos que necessitarem de funding no mercado interbancário internacional.
Vem a entrevista do primeiro-ministro.
Vem o plano da União Europeia de combate à recessão, e Durão Barroso afirma “ou nadamos juntos acabamos por nos afundar todos”.
Constam deste plano propostas importantes de ajuda ao sector automóvel, com linha de crédito de 40 mil milhões de euros.
O fundo de crise duplicado para 25 mil milhões de euros.
Verbas dos QREN adiantadas mais cedo.
FSE orientado para os desempregados.
Reforço do fundo de Ajustamento à globalização.
E é aqui que está a diferença fundamental entre esta crise e a de 1929.
Hoje os Governos e Bancos Centrais são muito mais activos. Têm mais instrumentos e mais vontade.
Mas então, e agora?
O que está faltando?
Nestes dias de turbilhão financeiro “confiança” tem sido a palavra mais ouvida, mas o medo tem sido o sentimento mais generalizado. Medo dos depositantes. Medo dos Banqueiros. Medo dos bancos emprestarem dinheiro uns aos outros. Medo dos políticos e dos reguladores de não encontrarem as medidas adequadas. Medo dos empresários por verem os seus projectos ficarem a meio por falta de dinheiro. O medo pode gerar recessões duradouras, com o contágio da crise financeira à economia real.
Por isso a preocupação dos responsáveis de reporem níveis de confiança no sistema. E é aí que todos nós temos de entrar, repor níveis de confiança nos nossos locais de trabalho - não temos outro remédio.
Não podemos mudar o “vento”, temos de nos moldar a ele, ajustando estratégias e sobretudo percebendo que mesmo nesta conjuntura difícil é possível sobreviver mas com introdução de mudanças significativas ao nível do nosso comportamento no dia-a-dia das nossas empresas.
Todas as crises geram oportunidades.
A presente crise financeira gera a oportunidade para uma melhor racionalidade na afectação dos nossos recursos, o que exige a melhoria da qualidade do investimento público e do investimento privado.
Não enterremos a cabeça na areia, pois de contrário iremos comprometer o nosso nível de bem-estar económico e social.
Não é altura de pensar em défice, a não ser no de confiança, que podendo ser difícil de restabelecer é absolutamente necessário.
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