Açoriano Oriental
Habitantes receiam "morte da economia da ilha" com redução militar dos EUA
Os comerciantes e outros moradores na Praia da Vitória, na ilha Terceira, estão preocupados com as notícias da redução do efetivo militar na base das Lajes, mas salientam que o impacto já se tem feito sentir.

Autor: Lusa/AO Online

 

"Vai ser a morte da economia da ilha e até dos Açores, mas principalmente da ilha Terceira. E o concelho da Praia [da Vitória] vai ser muito afetado com esta situação", disse à Lusa José Elvino Gomes, proprietário de uma loja de vestuário na principal rua da cidade.

Na Rua de Jesus, fechada ao trânsito, eram hoje poucos os transeuntes que ali circulavam e menos ainda os que frequentavam as lojas, um cenário muito diferente do que se assistia há algumas décadas, quando os militares norte-americanos se faziam notar.

Emílio Costa, reformado, com 70 anos, passou 51 anos ao balcão de um café e de uma mercearia de que foi dono no centro da cidade e ainda se recorda bem desses tempos: "Aqueles homens davam um movimento fantástico aí nessa Praia".

Hoje, os americanos não se veem nas ruas, fazem compras praticamente apenas nas grandes superfícies, mas na altura eram bons clientes para os cafés e para o comércio local.

A redução do efetivo militar norte-americano na base portuguesa das Lajes foi também tema de conversa, esta manhã, na barbearia de José da Rocha, aberta há mais de 50 anos, e quando se pergunta pelo tema os números estão na ponta da língua: um corte de 650 para 165 militares e civis norte-americanos e uma redução de 900 para 400 trabalhadores portugueses.

Na época em que a presença militar norte-americana era forte na ilha, a barbearia chegou a ter clientes da base e até tinha dois barbeiros que falavam inglês, mas hoje "é muito raro".

"Não se notam os americanos na Praia a não ser num restaurante à noite", lamentou José da Rocha.

A redução é preocupante, mas o anúncio não apanhou o barbeiro de surpresa, até porque a intenção dos norte-americanos já era conhecida desde 2012.

"Os americanos quando pensam numa coisa nunca viram atrás", frisou, lembrando que esta não é a primeira redução na base. "Saíram de uma vez 96 empregados, eram para ser readmitidos, mas nunca mais foram", acrescentou.

A preocupação com o futuro é geral entre os praienses, mas também o sentimento de que a situação exigia uma postura diferente por parte do Governo português.

"Até o próprio Governo parece que foi apanhado de surpresa, o que não se compreende como é possível acontecer uma situação destas. Acho que Portugal deve ter uma atitude forte: ou os americanos desistem da base de vez ou não andam a brincar com as pessoas", afirmou José Elvino Gomes.

As notícias que davam conta de um adiamento da decisão no Senado norte-americano, no final de 2014, descansaram o comerciante que se confessou surpreendido com o anúncio que aponta para uma redução até ao outono de 2015.

Também Humberto Lima, comerciante numa loja de frutas e legumes no mercado municipal, esperava uma postura mais dura de Portugal nas negociações com os Estados Unidos.

"Eu acho que os nossos governantes se deviam opor mais aos americanos: ou querem ou não querem, não é ficar ali com uma base com meia dúzia de pessoas", salientou.

O pai de Humberto Lima trabalhou na base, mas agora com o encerramento de postos de trabalho os filhos não terão a mesma possibilidade e o comerciante prevê um futuro negro para a ilha.

"A Terceira é possível que fique uma coisa parecida com as Flores e com o Corvo [ilhas mais pequenas]. Qual é a economia disto aqui? A construção civil está parada. A lavoura está passando aí uma crise que é uma coisa mal imaginada. O que é que vai ser da Terceira?", questionou.

Desde agosto de 2013, que os militares norte-americanos são destacados para as Lajes sem direito ao acompanhamento das famílias e por um período mais reduzido.

"Muitas casas que foram feitas para eles já estão a ficar vazias. Casas que rendiam a mil e tal euros e agora estão arrendadas a 300, 400", salientou José da Rocha, acrescentando que também quem trabalhava para os americanos a cortar relva ou a fazer limpezas deixou de ter emprego.

Humberto Lima trabalha no mercado municipal há 30 anos e também sentiu nos últimos tempos uma quebra no consumo por parte dos americanos, que sempre foram vistos como um bom cliente.

"Desde que há poucas famílias não aparece ninguém. Antes havia muitas famílias e o comércio trabalhava um bocadinho com eles", explicou.

Na loja de José Elvino Gomes, era também comum a visita de norte-americanos nas vésperas das festas de Natal ou dos bailes organizados na base, mas nos últimos anos são cada vez menos.

"Há coisa de três anos para cá tem vindo a diminuir constantemente o fluxo de americanos aqui no nosso comércio. Este Natal foi um desastre", frisou.

 

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