Açoriano Oriental
Falta de vento impediu Afonso de Albuquerque de conquistar Meca em 1513

O navegador e conquistador português Afonso de Albuquerque poderia, em 1513, ter conquistado a cidade santa dos muçulmanos, Meca, se houvesse vento no Mar Vermelho e tivesse recebido os 500 cavalos prometidos por Judá, relata em livro historiador José Manuel Garcia.


Autor: Lusa/AO online


Numa entrevista à agência Lusa, José Manuel Garcia contou o episódio que, por pouco, poderia ter alterado a História, baseando-se em referências históricas não contadas pelos cronistas do reino e que constam no livro "Afonso de Albuquerque, O Terrível - A Grande Biografia", lançado em Lisboa.

O autor, doutorado em História pela Universidade do Porto com uma tese sobre a Historiografia Portuguesa dos Descobrimentos e da Expansão nos séculos XV a XVII, considera o episódio como "o maior desastre" de Afonso de Albuquerque na região que ficaria conhecida, mais tarde, como o império português do Oriente.

"Queria chegar a Judá, um porto que dava acesso a Meca, aparentemente porque queria destruir Meca. Queria combater, como cruzado, os muçulmanos, ir ao coração dos muçulmanos para destruir Meca. Mas o vento não ajudou. Não conseguiu também destruir Aden, porque as escadas com que fez o assalto partiram-se", conta a Lusa.

"Não conquistou Meca, não conquistou Aden, não conquistou o Mar Vermelho, teve de retirar e, devido às doenças que se registaram no Mar Vermelho morreram cerca de 700 portugueses, um dos maiores desastres que teve e que nunca contou", lembrou.

Garantindo que os cronistas "disfarçaram" o episódio, José Manuel Garcia, 61 anos e natural de Santarém, disse ter encontrado as informações em referências histórias, que dão conta de que morreram também muitos marinheiros portugueses por doença, fome e calor.

"Há referências que mostram que houve mais vítimas por doença, por calor e por deficiência de alimentação do que nas conquistas de Goa, em que morreram cerca de quarenta e tal pessoas, e de Malaca e Ormuz, em que morreram também muito poucos", acrescentou, lembrando que Afonso de Albuquerque contava com 800 a 1.500 homens.

"Conseguiu dominar todos os pontos estratégicos, menos o Mar Vermelho, porque aquilo era um inferno de calor e não havia uma base logística. Queria construir uma fortaleza, mas não conseguiu a base logística para o fazer. Foi um desastre completo", salientou.

A "desgraça" de também não ter conseguido dominar estrategicamente o Mar Vermelho, em 1513, acrescentou, ocorreu num período de "glória" do conquistador que foi apelidado como "o terrível", porque havia livros que cantavam a conquista de Malaca, Goa e Ormuz

"Foram grandes conquistas militares contra inimigos muito mais poderosos. É

um pouco a imagem de glória que nós temos, mas também é um homem que sofria imenso para conseguir impor essa tentativa de cumprir os planos régios de D. Manuel, enviados de Lisboa, e que adaptava à sua maneira", frisou, abrindo caminho à explicação do "cognome" de Afonso de Albuquerque.

"Muitas vezes, devido à falta de recursos, realizava ações maquiavélicas: tinha um inimigo, o rei de Calicute, o samorim de Calicute, e mandou envenená-lo. Outro, um ministro do rei de Ormuz, mandou-o executar à punhalada. Sempre que havia um qualquer obstáculo, ele afastava-o, a bem ou a mal, para conseguir impor a autoridade portuguesa", explicou.

"É terrível porque tinha de impor o domínio e o poder português com base em muito pouco poder humano. As expedições que comandava eram de cerca de 1.500 homens. No caso de Malaca foi com 800. Tinha muito pouco poder humano, mas muito poder tecnológico, com bons navios e boa artilharia, uma boa estratégia para combater os muçulmanos, que eram os inimigos religiosos e económicos -- religião e economia estavam juntas -, para conseguir impor um controlo estratégico", relatou.

Mas era também "conciliador", só que essa conciliação de um homem "hiperativo" -- morreu em 1515, aos 63 anos - surgia geralmente depois da violência e do domínio, como tentou em Calicute, após a morte do rei.

"O grande sonho que tinha, tal como o rei D. Manuel, era destruir Meca, porque era um objetivo um pouco de vingança, para, depois, conseguir libertar a Terra Santa, a Palestina. Não o conseguiu porque o vento não o deixou, porque estava também à espera de conseguir 500 cavalos. A estratégia era conseguir uma missão rápida com 500 cavaleiros", disse, para pormenorizar mais a "desgraça".

"Seguindo as informações que recebera, seria possível a partir de Judá, com 500 cavaleiros, fazer uma incursão surpresa e devastar Meca. Segundo contou, iria até destruir os ossos do profeta Maomé, que pensava que se encontravam em Meca. Estavam em Medina, mas isso ele não sabia. Se essa faceta da cruzada que ele defendia tivesse resultado não sabemos como seria a História", concluiu.

José Manuel Garcia, que está a preparar agora um livro para as comemorações, em 2019, dos 500 anos da viagem de circum-navegação de Fernão de Magalhães, já publicou obras de Fernão Mendes Pinto, Luís Fróis, Alexandre Herculano, Sousa Viterbo, Virgínia Rau, Jaime Cortesão e José Leite de Vasconcelos, além de ter publicado abundante bibliografia sobre História de Portugal e dos Descobrimentos.


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